Romero Brito na fogueira dos condenados das redes sociais

É um exercício interessante a observação de como se desenvolve o conceito de justiça nas redes sociais, maleável conforme as circunstâncias, com heróis ou bandidos eleitos às pressas, de tal modo que às vezes é preciso tirar ligeiro uma bruxa que começa a arder nas chamas do Facebook, do Twitter ou do Instagram, porque de uma hora pra outra aconteceu alguma coisa que aponta no herege as qualidades de um santo.

As ondas virtuais alteram de tal forma a compreensão do que é a virtude, que muitas vezes confunde-se como sendo admirável indignação o que é visivelmente apenas uma grosseria. Isso acontece com várias batalhas manipuladas da atualidade, mesmo em questões de bases muito sérias, como reivindicações identitárias ou raciais.

Hoje em dia, temas como este podem conduzir o debate a um nível impressionante de coação, tachando-se a opinião divergente simplesmente de racista, machista ou da defesa de privilégios de elite — evidentemente branca, masculina e também heterossexual. No clima embrutecido desses dias, até um breve porém pode levar à acusação de ser um fascista.

Tudo depende de como estão os nervos no momento. Na semana que passou teve este caso de uma mulher que entrou na loja do artista plástico Romero Brito em Miami e depois de falar brevemente com ele, aos gritos, quebrou jogando ao chão uma peça de sua autoria. Um desses idiotas que para lacrar filmam toscamente tudo que veem pela frente publicou o vídeo e de imediato decretou-se a culpa de Brito, contrariando o que está muito claro na gravação: ele foi a vítima.

Não gosto desse sujeito nem do que ele faz, mas isso não vem ao caso. Sou dos que o acham um desprezível puxa-saco, no entanto faço parte da minoria que vê como condenável a bajulação de um artista tanto a Jair Bolsonaro quanto ao PT. E Brito procurou obter vantagem aproximando-se dos dois governos.

Acontece que a imediata condenação no barraco armado na sua loja foi em grande parte porque ele fez recentemente um retrato de Bolsonaro. E não se enganem: se o governo fosse do PT ele estaria sendo condenado pelo outro lado, pois fez também um retrato de Dilma Rousseff.

Depois do artista já ter sido atacado ferozmente nas redes sociais soube-se finalmente, por outro trecho da confusão criada na sua loja, que a ação agressiva da mulher foi porque ele pediu desconto no restaurante dela, além de ter exigido que os profissionais que o atendiam parassem de conversar entre si.

Bem, não vem ao caso o modo que foi feito esse pedido, até pelo fato da avaliação disso ser subjetiva. Porém, um cliente tem o direito de exigir como deve ser atendido. Se terá o desejo satisfeito, isso é outra conversa. E caso se exceda na forma dessa exigência, existem meios do responsável resolver a questão, inclusive os legais. Não é com a agressão cometida pela mulher na loja do artista. O vídeo mostra que ela poderia até tê-lo machucado.

Conforme se diz nas matérias sobre a confusão, a peça destruída teria custado o equivalente a 29 mil reais, o que eu duvido que seja verdade, mas vá lá: aceitemos a versão. Pois a agressora agora depende da boa vontade do artista para não ter que pagar uma quantia muito mais alta em indenização, caso ele resolva entrar com um processo. Embora ela tenha sido exaltada porque Brito é um inimigo político de certa parcela das redes sociais no Brasil basta o que está nos vídeos para que haja uma severa condenação em qualquer tribunal americano.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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