![](http://soldacartum.files.wordpress.com/2007/11/bueno11.jpg?w=300)
Da Espanha a Portugal, do País Basco à Galícia, da Catalunha ao México, Cuba, Guatemala, passando por representantes de todos os países sul-americanos – do Uruguai à Venezuela -, no belo auditório do Instituto Cervantes, na Paulista, e no da Caixa Cultural, na Sé, durante cinco dias, de manhã à noite, um só assunto – poetas e poesia. Para este vosso renitente escriba, além da enorme alegria de reencontrar, entre outros, o cosmopolita Roberto Echavarren, o mais importante escritor vivo do Uruguai, o não menor encanto de estreitar amizade com a poeta Coral Bracho, tão cultuada no México quanto Cecília Meireles no Brasil. Poeta de finuras e delicadezas, ela própria um ser forjado a porcelana e cristal…
Há poetas que sugerem misturar-se ao que escrevem. Clarice Lispector, indiscutível poeta da prosa, tinha o dom, inefável – ainda que perpassado pela beleza trágica – de, digamos, fazer-se ler por inteira: palavra e vida, uma só coisa; e espantosa! A própria Cecília Meireles fazia questão de representar, na carne, o poema – noite e dia.
Nem um pouco diferente com Coral Bracho e sua fragilidade de louça, mulher pequena, requintada, e de intensos cabelos negros. Os olhos, amendoados, e muito escuros, até eles, não exagero, leitor, pareciam ver além das luzes do auditório.
Não resisto a uma deslavada imodéstia: apresentados, surpreendida de que estivesse frente a este pequeno pintor das tardes melancólicas da Floresta, o que não deixa de ser uma confissão poética, já não falava, sussurrava um terno espanhol dourado. Não por mim, que, evidente, não o mereço, mas sobretudo por Mar Paraguayo, de todos os meus livros o que, até aqui, melhor venceu fronteiras.
Encantou-se com minha leitura que trata de Brinks, o diminuto cachorrinho da marafona de Guaratuba, o qual, no livro, quanto mais diminui, em guarani, através da fala e afeto da personagem (de Brinkezinho a Brinkezinhinhonhozinhinho), maior apresenta-se como significante e menor como significado, a ponto de “desaparecer” naquilo que “só pode ser visto no microscópio”. Feito as bactérias.
Mas nada se compara, óbvio, a Coral Bracho, uma das maiores poetas de língua espanhola, irmã do raro lírio que nasce nos brejos do lago de Chapaya. Flor e anjo, com sua pele de veludo e os ombros, tão estreitos!, apanhados por uma blusita “blanca” de delicadíssimo crochê. E as mãos, daquelas que fazem chorar as chuvas pequenas, se é que me faço entender.
Porque Coral Bracho, como nos melhores koans, sabem como ela é? Coral Bracho não é, leitor, posto que Coral Bracho é uma nuvem. Neblina e chuvisca, o discreto olor dessas almas que não se fazem mais. Poesia da vida, sim, que o corpo todo reverencia.
Wilson Bueno [11/11/2007]O Estado do Paraná.