Esses dias, a Dora Urban postou em seu perfil no Facebook as delícias matinais do sítio em que descansava no final de semana. Quase tive a sensação de ouvir o timbre suave e doce de sua voz, se expressando por meio daqueles registros. Tudo canta em volta dela. Inspirada pelas imagens que vi, corri no quintal, arrastando um pouco de culpa por ter esquecido de aproveitar as dádivas que a natureza nos oferece, pedindo em troca apenas e tão somente que a respeitemos e cuidemos dela.
Consegui surrupiar dos passarinhos as últimas mangas da estação que alcancei. Eles tinham a facilidade de chegar até as mais altas e esticar tal desfrute por mais alguns dias. Depois dessas, somente poderei voltar a vê-las na próxima temporada. As romãs também já se despediram, assim como as jabuticabas, enquanto ensaio um olhar esperançoso para as flores e a expectativa delas que acredito perceber no pé daquela ameixinha amarela (que nunca lembro o nome), da pitangueira e da amoreira. Lembro, sim, de, nessas idas e vindas, só ter pego uma vez um caju e, quando é época, de ter colhido laranjas e as bergamotas para o café da manhã.
A bem da verdade, não lembro de alguma vez ter sentido a falta de limões ou de sequer precisar comprá-los no supermercado, nem na quitanda. Dos temperos que plantei, ainda restam resistentemente o manjericão, o alecrim, a cebolinha e o orégano. E se alguma comida industrializada ou as tentações açucaradas de formiguinha não forem bem digeridas, recorro ao Boldo do Chile que dá o ar da graça o ano inteirinho em volta da grade, já quase no muro do vizinho.
Para uma urbanoide ferrenha, essa fartura tem um valor incalculável e arranca sorrisos de contentamento. Também nos reconecta à beleza do que é simples e traz uma sensação de paz, capaz de fazer qualquer pessoa se distrair um pouco dos seus dramas palpáveis e esquecer-se por breves momentos da realidade lá fora. Tem uma pitada de nostalgia e de perseverança nessa receita.
Obrigada, Dorinha, por compartilhar suas alegrias matinais carregadas de lirismo. Pisei na terra, respirei fundo e me abasteci da energia necessária para seguir adiante. Volto mais forte para continuar me indignando e sentindo saudades do que evoca as preciosidades da vida e das coisas que, inspirada pela resistente natureza, nos nutrem de esperanças e da boa fé.
E o “Beija-flor no hibisco”, de onde saiu esse título? Então, enquanto voltava, bati o olho na cena. Ela me reteve ali mais um pouco, prendendo a respiração e com receio de atrapalhar a performance e o ritmo daquele sinuoso balé. Coloquei-a logo em destaque, bem no alto, para nunquinha esquecer de falar das flores. Ainda mais quando elas imprimem tamanho frescor à paisagem.