O bem informado leitor já ouviu falar da ELA? Se não, lembre-se do físico inglês Stephen Hawking, falecido em 2018. A ELA, ou Esclerose Lateral Amiotrófica, é uma síndrome rara, neurodegenerativa, progressiva e incurável. Começa com fraqueza e a paralisia dos membros superiores e inferiores da pessoa; depois, aos poucos, causa a perda da capacidade de falar, de deglutir e até de respirar. No entanto, o cérebro continua funcionando normalmente, assim como a audição. Estima-se a existência de 15 mil portadores da doença no Brasil e mais de 200 mil no mundo.
Pois aqui em Curitiba temos uma pessoa, chamada Maria Lucia Wood Saldanha, advogada de formação, com bons serviços profissionais prestados ao Sistema FIEP, que tem lutado bravamente contra a doença. Começou quando ela tinha 47 anos, com atrofia muscular nas mãos, progredindo para cãibras, espasticidade, dificuldade para falar e engolir, inclusive a saliva, falta de ar e labilidade emocional. Hoje, encontra-se totalmente imobilizada. Recolhida a uma cadeira de rodas especial, apenas mexe os olhos e os lábios, mas não fala. Só se comunica com o olhar, graças a um programa especial de computador, denominado Tobii, que capta os movimentos da íris e reconhece as letras olhadas. A alimentação é feita por sonda gástrica e é utilizado um ventilador mecânico ligado na traqueostomia para respirar.
Ainda assim, a brava Maria Lucia consegue comandar a casa, a família e a vida apenas com o olhar. Plenamente consciente, continua levando a vida, sai de casa, usa táxi e até ônibus, vai ao shopping e, sempre que possível, à Arena da Baixada, torcer pelo seu Athletico do coração. Escreveu até um pequeno livro de 100 páginas, editado pela Editora Ataîru, que já vendeu, pela internet, mais de 700 exemplares, inclusive na Itália, Canadá, Inglaterra e Austrália, com a renda revertida para a Associação Pró-Cura da ELA.
Apenas com o olhar, Maria Lucia é capaz de expressar o que sente, o que pensa e o que acha de tudo. Não se considera uma coitadinha; pelo contrário, sente-se uma felizarda por estar fazendo o que faz, como pode. Normalmente, a expectativa de vida dos portadores da ELA é de dois a cinco anos. Maria Lucia está viva há dez e sonha com uma cura. Sofreu com planos de saúde, com atendimentos hospitalares incompetentes e relapsos e com um sistema de previdência social arcaico e obtuso, que se recusava a conceder-lhe a aposentadoria por invalidez, apesar dos laudos médicos e da perícia do INSS, mas nunca se deixou abater. E está na luta. É um exemplo de vida e de luta.
Maria Lucia sabe que não é fácil viver como vive, que o desafio é diário e constante, mas aprendeu também que é possível ser feliz, mesmo com tantas limitações. Depende de terceiros para escovar os dentes, tomar banho, limpar-se, vestir-se, virar-se na cama, ser colocada na cadeira, ajustar o computador, colocar e tirar os óculos, alimentar-se e até coçar-se. Mas diz que aprendeu muito com a doença, como ter mais paciência, saber esperar, falar o que dá vontade, não deixar nada para amanhã e valorizar as pessoas pela essência…
“Cada dia é um presente que Deus me dá” – registrou em seu livro.
Por isso, Maria Lucia não deixa de sonhar. Refere-se a sonhos, não a objetivos. E entre os seus sonhos está viver ainda muitos anos. Disposição não lhe falta. Sonha também que possa, um dia, ter a chance de ser beneficiada com a cura. Fé também não lhe falta. Se eventualmente isso não for possível, já tem a certeza de que a sua vida foi bem vivida.
Ave, Maria Lucia! Louvada seja!