O presidente de El Salvador, Nayib Bukele, já avançou sobre o Legislativo e o Judiciário de seu país, persegue jornalistas, coleciona presos políticos e governa, há um ano, em um estado de exceção, que permite que suas forças de segurança levem para atrás das grades quem quiserem, incluindo menores de idade, muitas vezes sem julgamento prévio, deteriorando o Estado de Direito.
Durante a pandemia, nos centros de confinamento de pessoas suspeitas de estarem contaminadas com o vírus da Covid-19, Bukele já havia ensaiado a criação de lugares onde a lei não entrava, e uma pessoa poderia ser trancada por dias ou semanas sem nem mesmo fazer um exame.
A imprensa independente e organismos de direitos humanos, à época, apontavam para o uso das medidas sanitárias para controle político.
Os mesmos organismos também denunciaram abusos de direitos humanos nas prisões salvadorenhas mesmo antes de Bukele ter decidido —após um fim de semana do início de 2022 em que houve enfrentamentos violentos das chamadas “maras” (facções criminosas ligadas a cartéis de narcotráfico) e que resultaram na morte de mais de 60 pessoas— que construiria o que diz ser hoje a maior prisão das Américas.
Eles mostram os presos quase como escravos esperando um barco para uma colônia distante. Filmados de todos os ângulos, como numa grande produção, os detidos, seminus, de olhar assustado, acorrentados e de cabeça baixa, evocam morbidez e algo de sadomasoquismo.
Não se pode criticar Bukele sem antes deixar claro que as “maras” castigaram o povo de El Salvador desde que nasceram, nos subúrbios de Los Angeles, com os filhos daqueles que haviam migrado por conta da guerra civil.
Nos anos Clinton, muitos de seus membros foram deportados e se encontraram com uma economia golpeada e deteriorada pelo conflito, na qual não teriam lugar.
A Mara Salvatrucha e o Barrio-18, grupos mais importantes, vinham sequestrando, matando e extorquindo o povo salvadorenho. Ter colocado um freio nas atividades dessas gangues rende a Bukele hoje uma popularidade de mais de 80%.
A questão é que amontoar pessoas em prisões, como Bukele está fazendo, em primeiro lugar, não resolve o pano de fundo da questão: o que os levou ao crime. Em segundo, significa mais avanços sobre os pilares de direitos universais.