Nota de falecimento: com símbolo doce de passarinho, Twitter encantou até morrer de cólera

Passarinho foi atingido pela cólera dos usuários e passou a defecar na cabeça de todos

Ele nasceu cheio de sonhos. Com nome inspirado no verbete que em português significa “gorjear”, era uma rede social despretensiosa, que queria apenas replicar pequenos momentos de seus usuários.

Em tempos de blogs e longos artigos, se tornou um recurso para as pessoas compartilharem, em 140 caracteres, o que acontecia em suas vidas. Perguntava “o que você está fazendo?” e milhões dividam seus “tweets”, ou “tuítes”, descrevendo momentos de suas vidas com os amigos virtuais.

Mas o ser humano gosta mesmo é de reclamar e falar mal dos outros. Por isso, em pouco tempo, nossa amiga trocou a pergunta para “O que você está pensando?”.

Se tornou o principal aliado dos oprimidos da sociedade. A expressão “vou xingar muito no Twitter” virou um grito de guerra após uma fã do Restart se indignar com o cancelamento de um show. Há quem diga que foi o motivo do fim da banda.

Também foi responsável por divulgar grandes frases da humanidade, como: “Fui! Vocês não merecem falar nem comigo nem com meu anjo!”, de Xuxa. Ou: “Ânimo galera, vai melhorar tudo depois da Copa de 2014”, de Dejan Petkovic. Ou “crime ocorre, nada acontece, feijoada”, de um coreano desconhecido.

Com a chegada de concorrentes, como Facebook e Instagram, todos acharam que ela iria morrer. Mas sobreviveu, enquanto seus inimigos desfaleceram. Mas como todo anti-herói, seu maior inimigo era ele mesmo.

O passarinho que tanto voou pelo mundo foi atingido pela cólera de seus usuários e passou a defecar na cabeça de todos. Um simples tuíte de “bom dia” terminava em uma discussão de quem tem ou não o privilégio de ter um bom dia. Quem postava “meu cachorro comeu chocolate” era acusado de assassino de cachorros.

Até que ele foi comprado por um herdeiro de minas de diamantes que apenas precisava de atenção. A necessidade por likes nunca saiu tão cara. Como uma criança dona da bola, demitiu os cérebros da empresa, passou a cobrar pelo “selo de verificação” e se recusou a retirar posts de ódio e apologia a massacres.

Se antes voava, hoje navega desgovernado, com seus usuários pulando fora como os passageiros do Titanic. Os poucos que sobraram agem como se estivessem em um fim de festa, conversando com desconhecidos e chutando latinhas no chão. Até que, aos 17 anos de idade, o Twitter faleceu.

Ou, como disse um tuíte incompleto do G1, “Morre o inesquecível”.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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