As vantagens que a farda oferece

E os milicos, hein?! Tão patriotas, tão escrupulosos, tão obedientes, tão ciosos de suas obrigações… mas, na surdina, vêm captando vantagens e inflando salários com ajudas de custos que podem somar R$ 300 mil! O motivo são as mudanças de cidade ou a ida à reserva.

E veja-se que o mimo não foi uma gentileza do tempo das trevas bolsonarianas. Vem de longe e continua a acontecer sob o governo de Luiz Inácio. A mais recente contemplação teria ocorrido em março passado, decidida pelo Alto Comando do Exército. Setenta e cinco oficiais foram atingidos, onze generais de quatro estrelas. A ajuda teve um custo total de R$ 4,3 milhões – uma média de quase R$ 100 mil por beneficiado.

Houve casos de generais que acumularam as ajudas de custos. Foi o caso do gen. Ricardo Augusto Ferreira Costa Neves. Promovido a quatro estrelas em agosto de 2022, recebeu R$ 130,9 mil para deixar o Comando de Operações Terrestres, em Brasília, e assumiu o Comando Militar do Norte, em Belém. Mas em março de 2023 foi nomeado para o Comando Militar da Amazônia e teve que se mudar para Manaus, com ajuda de custa de 159,9 mil. Somados, os recursos do auxílio chegaram a R$ 290 mil.

O Exército argumenta que os repasses são previstos no decreto nº 4.307/2002 – tempos efeagacianos –, cujo art. 55, inciso I, estabelece que a ajuda “é devida ao militar e serve para atender despesas com locomoção e instalação, excetuando as despesas de transporte, que estão abrangidas na indenização de transporte regulada no art. 23 e seguintes do mesmo dispositivo legal”.

Se o fardado tiver dependentes, receberá duas vezes o valor de remuneração como auxílio. Se a origem ou destino for uma cidade considerada de categoria A, o valor sobe para quatro vezes o salário.

Se o militar for para a reserva, o valor será oito vezes o último salário de seu último posto – saldo que chega a R$ 300 mil em caso de generais de quatro estrelas.

A justificativa é que a carreira militar é cheia de percalços, com mudanças constantes e que a instabilidade prejudica as famílias. A pós-doutoranda em ciências políticas da Unicamp Ana Penido, pesquisadora do tema Forças Armadas, no entanto, garante que as situações são próprias da carreira militar e devem ser consideradas na hora de escolher a profissão. E destaca que “dar benefícios financeiros para além das já boas aposentadorias não deveria ser uma estratégia para a política de defesa de um país”.

Pois é, mas, segundo informa a Folha de S.Paulo, em 2022 foram destinados ao Exército, para o pagamento de movimentações militares, R$ 615 milhões; para a Marinha, R$ 279 milhões; e para a Aeronáutica, R$ 145,2 milhões.

Tão diferente do trabalhador comum, civil, que além de amargar um salário mínimo de R$ 1.212,00, usa o transporte coletivo para locomover-se e, quando se aposenta, recebe aquela merreca paga pelo INSS, sem qualquer ajuda de custo ou coisa que a valha…

Para completar o quadro, a Folha revelou que o atual comandante do Exército, gen. Tomás Paiva, recebeu R$ 770 mil em fevereiro e março deste ano a título de ajuda de custos e indenizações pecuniárias. Tudo dentro da lei, é claro.

O Centro de Comunicação Social do Exército explica: “Se o oficial-general indicado para o cargo de comandante de sua respectiva Força estiver na ativa, será transferido para a reserva remunerada, quando empossado no cargo”.

Segundo o Exército, Tomás teve direito ao pagamento de R$ 388,9 mil como indenização por férias atrasadas não gozadas e não ter aproveitado a licença especial quando ainda estava em vigor. Além desse valor, recebeu R$ 304,1 mil como ajuda de custo por haver passado para reserva. O valor é calculado em oito vezes o salário bruto do último posto que ocupou. Por fim, o general recebeu a ajuda de custo de R$ 77 mil para se mudar de São Paulo, onde chefiava o Comando Militar do Sudeste, para Brasília. Tudo isso fora a remuneração recebida mensalmente. E tudo livre de impostos, é claro.

Bem feito para nós que não usamos farda. Mas pagamos a conta.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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