Dona Laura mudou-se de novo; saiu uma vez porque o apartamento era frio, ficou um tempo fora e não sossegou até comprar o apartamento quente aqui mesmo. Morar em Curitiba requer a sorte de cair no lado norte ou no lado sul; no primeiro a casa é quente, no outro é fria. Pior que o curitibano, como o brasileiro em geral, não se orienta pelos pontos cardeais, como a gente vê qualquer imbecil fazendo em filme americano. O norte e o sul são leros de corretor para empurrar imóveis – que, melhores que sejam, dia mais dia terão o espigão tirando-lhe o sol, pois Curitiba tem dono, os especuladores imobiliários e os donos dos ônibus que contratam prefeitos e vereadores para o serviço sujo. Dona Laura caiu nessa e veio para cá, saiu e voltou. Uma mulher, diziam, de mal com a vida, solitária, azeda, barraqueira; para mim um doce de pessoa, interessante e engraçada em estado de repouso e melhor ainda quando adotou o pincher, substituto da filha que se mandou para a Bélgica.
Venci a prevenção contra Guarapuava graças a dona Laura. No varejo, porque no atacado a prevenção vem da universidade com a turma de cascas grossas barulhentos do centro acadêmico. Dona Laura, casca grossa fascinante, conquistou-me no aparte durante a reunião do condomínio: “não se meta comigo que sou de Guarapuava; lá as mulheres mijam contra o vento e não molham as canelas”. Muitas vezes compartilhei o elevador com dona Laura. Um dia ela me peitou com a pergunta: “por que você fica olhando meus tornozelos”. Inventei uma desculpa, mentirosa como todas. Confesso que tenho medo de cascas grossas, saí assim de dentro de minha mãe, ao contrário do presidente Lula, que nasceu valente e destemido, cangaceiro, peixeira no punho petista que se abre nos acordos com o Centrão. Vim de Ponta Grossa, filho de mãe meiga. Em Ponta Grossa casca grossa como dona Laura só teve uma: Joice Hasselmann, que se meteu a mijar contra o vento e ficou ensopada.