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De quatro em quatro anos, eis que retorna aquela velha tese de que o mapa das urnas racha o Brasil. De um lado o norte, nordeste e sudoeste, do outro, os inconformados militantes da causa separatista no Brasil. Um movimento que ganhou bandeira no Bar Botafogo, em Curitiba, quando um grupo de inconformados com a eleição do “Caçador de marajás das Alagoas” criou a frase que se espalhou em adesivos pelo Brasil meridional: “O sul é o meu país”. Um galhofa de mesa de bar que virou ideologia de pára-choque de caminhão.
Quando Cristovam Buarque insiste na ladainha da educação, sua cantilena tem razão: um dos maiores problemas do Brasil é a interpretação de texto. O brasileiro tem a mania de levar piada a sério. A entrelinha é levada ao pé da letra. Ironia, então, é de leitura muito mais complexa. Daí que muitos autores aconselham que, quando se faz uso da ironia, frise-se o adendo: “Atenção, isto é uma ironia!”.
Portanto, esse debate separatista no Brasil precisa ser mais aprofundado, explicitado. E atenção: isto é uma ironia! Não que a discussão implique em novas divisas geopolíticas, uma cisão republicana. Apenas uma maior autonomia de costumes para as diversas regiões do país.
Como exemplo, podemos tomar o caso da comunidade amish, nos Estados Unidos, que acaba de sofrer atentado em uma de suas escolas, onde morreram cinco meninas e outras sete pessoas restaram feridas. A imagem que temos dos amish vem do filme A Testemunha, com Harrison Ford: os homens de ternos e chapéus pretos, as mulheres com a cabeça coberta por uma touca escura. Todos trabalham na agricultura e pecuária, com carroças e arados puxados por animais. Não possuem automóveis para não criar diferenças sociais. Não se faz uso da eletricidade e do telefone. A comida é preparada em fogões a lenha, guardada em geladeiras movidas a gás. Pacifistas, os homens se recusam a servir o Exército. A educação para os amish significa aprender apenas o necessário e nenhum membro da comunidade completa os estudos ou vai para a universidade. Para conseguir o direito de interromper os estudos antes de 16 anos, foi preciso obter uma decisão da Suprema Corte Americana, em 1972.
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Comunidades autônomas e com usos e costumes próprios, o Brasil está precisando de muitas. A cada brasileiro, sua própria Passárgada: “Lá sou amigo do rei / Lá tenho a mulher que eu quero / Na cama que escolherei”.
O Rio Grande do Sul, convenhamos, há muito tempo merece sua independência. Entrone-se Luiz Fernando Veríssimo no Palácio Piratini e revoguem-se disposições em contrário.
Paulistas e paulistanos, os males do Brasil são. Eles que continuem com os seus conhecidos hábitos antropofágicos, porém restritos às suas atuais divisas; e que nos poupem de seus exóticos representantes na Câmara Federal.
Aqui no Paraná, a Passárgada do poeta Manuel Bandeira cabe ao escritor Domingos Pellegrini, dentro dos limites de Londrina. Pois que assim seja, a Comunidade Pé-Vermelha do Norte do Paraná, livre e soberana, acariciando o próprio ego e umbigo per seculum seculorum.
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“Vou-me embora pra Brasília / Lá sou amigo do rei / Lá faço as lambanças que eu quero / No cargo que escolherei.” Assim poderia versar o hino da comunidade dos Petistas Aloprados do Brasil, lá onde os fins justificam os meios, tendo por princípio que a impunidade de cada um é condição para a impunidade do outro. Companheiros, nada tendes a perder senão as cadeias. Uni-vos!
Dante Mendonça [06/10/2006]O Estado do Paraná.