Deu nas folhas: um chargista do jornal “El Nuevo Herald”, de Miami, armado com uma submetralhadora, se entrincheirou na redação do jornal para pedir a renúncia do diretor da publicação, Humberto Castelló.

Segundo informou o jornal, que é a versão para o mercado hispânico do “Miami Herald”, não houve feridos e a redação foi evacuada em ordem. A polícia cercou o prédio e negociou a saída do chargista. Ninguém foi feito refém, não se disparou um tiro.

O chargista, José Varela, depois de entrar na redação, começou a gritar, afirmando que era o novo diretor do jornal. Um jornalista do “Herald” disse que Varela assegurou que não faria reféns. “Está falando com o novo diretor do jornal, e estou aqui para desmascarar os verdadeiros conflitos do jornal”, disse o chargista, em conversa telefônica com um colega, segundo informou o site do “Herald”.

O blog de um dos repórteres, Ruy Ferreira, informou que, na semana passada, o chargista esteve na redação e disse que havia comprado recentemente uma escopeta e uma submetralhadora Uzi. Ele justificou a compra dizendo que não se sente seguro na área em que mora. Varela tem dois filhos e acabou de se divorciar.

Paralelos

Tenho uma certa experiência com chargistas. Os chargistas são os cartunistas que só disparam críticas gráficas contra aqueles que, na vida política, andaram fazendo besteira, ou seja, fazendo política.

Todo político é alvo legítimo para o chargista. O gesto extremado do (no fundo) bom Varela exemplifica aquela velha história do náufrago que, saindo do mar, e chegando a uma ilhota, pergunta à primeira pessoa que vê se é país e se há governo. Ao saber que “si, hay gobierno”, ele vai logo disparando (metaforicamente, no caso), “Soy contra”.

A piada deu o título a um famoso livro de charges políticas brasileiras, “Hay gobierno? Soy contra!” Isso lá pelas bandas (paratimbum, bum, bum…) do início da ditadura militar, num aninho em que ainda dava para se fazer crítica. Governo do liberal de saudosa memória, marechal Castello Branco, se não estou enganado.

Claro que, naquela época, tinha de ser em castelhano. Hoje talvez fosse de melhor compreensão se o título fosse em nosso maltratado português. Venezuelanos, cubanos, bolivianos e, agora, equatorianos, melhor poderiam entender e se divertir.

Daí, seria simples, conforme a velha fórmula: nosso glorioso exército pegaria de escopetas, apenas como adorno decorativo, e “sobremetralhadoras” (submetralhadora é coisa de subdesenvolvido) e faria reféns, sim senhor. Muitos reféns. E passaríamos à direção do subcontinente, para prosseguir com o paralelo do jornal.

O outro lado da moeda falsa

Mas eu ia dizendo, antes de divagar como um colunista social, que conheço chargistas e cartunistas. Nunca um deles pegou de uma “Uzi” e tomou conta de jornal. Ao menos no Rio de Janeiro.

Mais de um ameaçou de porrada chefe de redação ou da contabilidade, caso não tivessem seus salários postos em dia, mas ameaçar mandar bala? Nunquinhas. Golpe em redação? Querer tomar conta da publicação? Absolutamente, os cartunistas, mesmo os mais vitriólicos chargistas, quando muito queriam um aumento e depois se mandarem logo para o botequim para continuar o papo com o resto da turma.

Já vi cartunista ser ameaçado de levar tabefe, bala ou peixeirada. Jamais o contrário. Por esse motivo, por ter estado no bar com essa turma (até mesmo com dois de origem hispânica, o Lan e o Sábat) é que desconfio da filosofia editorial do “El Nuevo Herald” e acho que o chargista exaltado, o – e, no escuro, vou logo chamando de excelente – José Varela deveria passar a dirigir o jornal.

Uma ressalva apenas. José Varela não é nome de chargista. Ele teria de encontrar um nome profissional mais sucinto. Varel, por exemplo. Essa a tradição, ou maldição, segundo outros, dos chargistas e cartunistas: assinarem seus ataques gráficos com nomes bestas.

BBC Brasil

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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