A arte de envelhecer

Morreu, na semana, aos 113 anos, Tsuneyo Toyonaga, a mulher mais velha do Japão. A boa e vetusta nipônica, como era de se esperar em bem-aventuranças dessa ordem, nunca sofreu de nada e morreu, também como era de se esperar nesses casos, de falência múltipla dos órgãos, isto é, dormindo…

Impávida colosso, entretanto, a mulher mais velha do mundo, comprovado em cartório, continua sendo a muito nossa Silvina Rosa de Jesus. Nascida a 20 de junho de 1888, em Jacaraci, Bahia, vai fazer 120 anos (se fizer, claro…), quando o inverno chegar. E, sabemos, o inverno, logo, logo, há de bater à nossa porta. Em Curitiba, sabemos melhor, sempre antes do que a gente imagina… Pois D. Silvina, quem quiser lhe ver o rosto alegríssimo, escancarado numa gargalhada sem dentadura , sagrado despudor e doce descalabro, é só acessar o blog do poeta Fernando Karl (www.nautikkon.blogspot.com). Lá está D. Silvina, a ditar, alto e bom som (ouviu, Dante Mendonça?) o segredo de sua longevidade: cachaça, namoro e fumo de rolo. Pode?

Próximo ao túmulo do poeta-irmão, Paulo Leminski, no cemitério do Água Verde, morto infante, aos 44 anos, repousam, senhores, os restos mortais de minha avó paterna, Mariana Fonseca Bueno, falecida, pasmem!, aos 105 anos, em 1946. Até os cem, reza a crônica familiar, trançava rendas-de-bilro, os oclinhos de garrafa sobre o nariz aquilino.

Vejo-a aqui, no retrato antigo: severa e moça, o suave buço, ao lado do filho caçula, meu avô Emídio, então um lépido rapaz, mais sério que a mãe na foto de 1923. Ô vida! Ô Tempo que anda e anda , congelando, lá atrás, pássaro e vento, olhos e sorrisos.

O avô só não foi aos cem porque, pedestre renitente, uma kombi na contra-mão o matou aos 74 . Mas acabara de construir, sozinho, no Uberaba, uma casa de doze peças. Vera força da natureza!

Pelo visto, vão ter que me aturar por mais bom tempo, a chamar a atenção para céus e telhados, pinheiros e precipícios. Quase sexagenário, a passear visíveis 37 ( hehehe), sem a notória porralouquice que foi a maior marca de meus trint’anos em Curitiba ( né mesmo, Almir Feijó?), pode que incomode por mais meio século. Ai das hienas papudas ou dos críticos tortuosos, senhores das histórias e das “desestórias” das desinteligências!

Gosto mesmo é do Oscar Niemeyer, 100, a dizer sonoros palavrões quando algo vai mal no escritório e das pernas da Derci Gonçalves,103, nas entrevistas ao

Jô Soares.

E por falar em cousas lindas, muito mais que findas, cadê o sempre álbum de família de Iara Teixeira, no blog do Solda? Deliciavam-me aquelas gentes, em sépia, à volta do pai do Nireu Teixeira, a agitarem os palcos dos “theatros” curitibanos d’antanho.

Noites de espetáculo que, feéricas, existiram um dia, embora a distância, e a melodia da distância no tempo, feito uma brisa nas dobras da História. Que o digam D. Silvina, 119, suas cachaças, seus namoros, seus fumos-de-rolo.

Wilson Bueno [02/03/2008]O Estado do Paraná.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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