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As bulas de remédios são inúteis para os consumidores. Além de trazerem informações desnecessárias e assustadoras, vêm carregadas de advertências confusas, que podem abalar a confiança que os clientes têm nos médicos. O objetivo é fornecer argumentos aos advogados dos laboratórios em eventuais ações judiciais. Os consumidores que se danem.
A bula deveria prestar informações indispensáveis aos consumidores. Mas não o faz com eficiência. A primeira dificuldade é o tamanho das letras. Antes de tomar o remédio – os redatores das bulas diriam “ingerir o medicamento” – o cliente deve lembrar-se da relação de Jesus com as crianças e exclamar
“vinde a mim as pequeninas”.Quem lê as bulas? Quase sempre as pessoas mais velhas. Ou porque vão tomar aqueles remédios ou porque vão administrá-los a quem, mesmo sabendo ler, não entenderia o que ali vai escrito. Os laboratórios não pensaram nisso ao escolher letras tão pequeninas. Ou pensaram e quiseram economizar papel. Seus consultores diriam “otimizar recursos”.
O cliente toma óculos ou lupa e começa a difícil tarefa de ler a bula. Na compra do remédio – os marqueteiros dos laboratórios diriam “produto” – houve dificuldade prévia. O balconista foi obrigado a decifrar os garranchos do médico. Como é que a sociedade brasileira tolera tamanha desconsideração e irracionalidade? A simples troca de letras pode transformar um remédio em veneno. E muitos médicos prescrevem suas receitas numa caligrafia incompreensível.
Cápsula, drágea, posologia, solução oral, ingestão concomitante etc., eis amostras de palavras e expressões muito freqüentes em bulas. Quem as entende? Na bula de uma pastilha, que sequer entrou numa escola de judô e por isso não tem faixa preta, lemos esta maravilha nas indicações: “nas irritações e dores orofaríngeas oriundas de infecções ou processos cirúrgicos, como auxiliar no tratamento de angina de Vincent”. Modestos, os pesquisadores dão o próprio nome às doenças que identificaram. O médico francês Henri Vincent estudou a angina e morreu aos 88 anos. Terá chupado muito a tal pastilha? Com faixas vermelhas ou pretas, os remédios custam sempre uma nota preta.
A bula tem uma história curiosa. As primeiras bulas eram marcas feitas com anel para autenticar documentos oficiais e tinham a aparência de bolas ou bolhas, ambas com origem no latim bulla.
Foi o rei francês Luís II, o Gago, que entre 877 e 879 denominou bula o selo real. Afinal, semelhava uma
esfera ou bola.Antigamente a embalagem mais comum dos remédios era uma garrafinha. Pendurada num cordão vinha a bula, que tinha o fim de atestar que não era uma garrafada, era um remédio oficial. A garrafinha passou a ser denominada frasco. A substância, que era líquida, passou a ser oferecida em comprimidos. A linguagem das bulas dos remédios deixou de defender os fracos e oprimidos. Hoje, só defende os frascos e comprimidos, como já ironizou antiga peça publicitária.
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Amigo é para essas coisas. Ao escritor Deonísio da Silva o meu muito obrigado por essa providencial bula. Dante Mendonça [16/11/2007]O Estado do Paraná.