A desistência na indicação do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) ao posto de embaixador em Washington não é garantia de que a diplomacia brasileira seguirá doravante rumos elogiáveis, mas sem dúvida alivia o país de um vexame de proporções internacionais.
É ocioso discutir se a tentativa do presidente Jair Bolsonaro de entregar o posto ao filho poderia ser enquadrada nas regras que vetam o nepotismo na esfera pública. O gesto, independentemente de interpretações do texto, fala por si: explicita um inaceitável avanço do mandatário sobre o caráter republicano das instituições.
A deplorável afirmação de Bolsonaro de que se pudesse serviria sempre filé mignon a seus herdeiros ilustrou, em sua vulgaridade, a natureza personalista e arrogante da escolha do filho ao posto.
Fosse o deputado um reconhecido talento diplomático, uma promessa de Joaquim Nabuco redivivo, opiniões mais flexíveis até poderiam se justificar. Mas não é o caso. Em matéria de credenciais para a função, o assim chamado 03 é pouco mais que um zero à esquerda.
Bastariam para desqualificá-lo as cenas de bajulação explícita ao presidente norte-americano, Donald Trump, por ele patrocinadas.
Ou mesmo o ataque sarcástico que ele desfechou contra a comunidade LGBT ao vestir uma camiseta descaracterizando a sigla num evento conservador em São Paulo –com fundos públicos, diga-se, do PSL.
Além do nepotismo de fato e de tais episódios constrangedores, há uma série de outros motivos para considerar que a indicação seria inapropriada. A índole para o confronto em desfavor do diálogo, a inexperiência e o despreparo faziam de Eduardo um candidato muito aquém da missão.
Embora o Senado, que precisa endossar a proposta do Executivo, pudesse, quem sabe, aprová-la, ficou evidente que a aceitação do nome se tornou insustentável.
A implosão do PSL, em meio a denúncias de falcatruas eleitorais e a uma guerra de acusações torpes no ninho bolsonarista, abriu ao deputado uma porta para a fuga.
Depois de perder a escolha para líder do PSL na Câmara, recuperando-a a seguir, Eduardo anunciou na noite da terça (22) que desistiria dos EUA. Em pronunciamento, reafirmou a convicção de que reúne qualidades para comandar a embaixada e procurou desvincular sua guinada da crise no PSL.
Teria se convencido de que o melhor é permanecer no Brasil para defender princípios conservadores e “fazer do tsunami que foi a eleição de 2018 uma onda permanente”.
É incerto se conseguirá levar a cabo tais objetivos, mas sem dúvida são mais adequados e estão mais à altura de suas possibilidades.