Célio Heitor Guimarães – Texto publicado no blog do jornalista Zé Beto
A reforma da previdência é a atual menina dos olhos do desconjuntado governo Temer. É outra farsa. O déficit previdenciário – qualquer alma pensante, medianamente informada, sabe – não se resolve com a taxação de aposentadorias e pensões, com a ampliação do tempo de contribuição e com o aumento do índice contributivo dos trabalhadores e servidores públicos. Isso é remédio de cínicos, hipócritas e mal-intencionados.
O déficit da previdência pública resolve-se cobrando os R$ 426 bilhões que são devidos ao INSS e que equivalem a três vezes o chamado “rombo previdenciário” brasileiro em 2016. Os números foram levantados pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (FGFN) e divulgados por Ana Magalhães, do portal “Repórter Brasil”, sem maior repercussão na imprensa tradicional.
A maior parte dessa dívida está concentrada em poucas empresas ainda ativas. Entre elas, gigantes como Bradesco, Caixa Econômica Federal, Marfrig, JBS (“aquela”, dona da Friboi e Swift) e Vale.
“As contribuições não pagas ou questionadas na Justiça deveriam ser consideradas na reforma” – afirma o presidente do Sinprofaz – Sindicato dos Procuradores da Fazenda Nacional.
Procuradas para o contraditório as inadimplentes valem-se da desculpa-padrão: “não comentamos processos em juízo”, “estamos negociando a dívida com a Receita Federal”, “aguardamos a possibilidade de compensação de débitos”. Ou, simplesmente, recusam-se a se pronunciar.
Para o coordenador-geral de grandes devedores da Procuradoria da Fazenda Nacional, Daniel de Saboia Xavier, “o verdadeiro ajuste fiscal é cobrar de quem deve para não onerar quem paga”. Simples assim. Só não vê quem não quer. Ou não tem interesse de ver.
Dever para o governo é ótimo. Para quem tem poder de fogo. Embaralham inadimplência com sonegação tributária, sem grande risco, e valem-se da morosidade da Justiça, da complexidade da legislação e de programas de concessões do governo, como os tais “Refis” editados nos últimos 17 anos. Com disso – garante a professora Sônia Fleury, da Fundação Getúlio Vargas –, “os grandes grupos empresariais questionam valores na Justiça e ficam protelando a dívida a vida inteira”.
No caso dos servidores públicos, os grandes devedores são a própria União e os próprios Estados, que não honram a parcela que lhes cabe, como empregadores, e, no mais das vezes, deixam de recolher ao cofre previdenciário os valores descontados dos barnabés. Dá no que está dando.
Para registro, as vinte maiores devedoras da Previdência (em milhões de reais) são: 1º – Varig (3.713); 2º – JBS (1.837); 3º – Vasp (1.683); 4º – Associação Educacional Luterana do Brasil (1.582); 5º – Banco Comercial Bancesa (1.418); 6º – Transbrasil Linhas Aéreas (1.219); 7º – Marfrig (811); 8º – Instituto Candango de Solidariedade (700); 9º – Instituto Presbiteriano Mackinzie (648); 10º – Águas e Esgotos do Piauí (585); 11º – Prefeitura Municipal de Guarulhos (564); 12º – Associação Sulina de Crédito e Assistência Rural (550); 13º – Prefeitura Municipal de São Paulo (549); 14º – Caixa Econômica Federal (549); 15º – Teka (em recuperação) (500); 16º – Dedini (em recuperação) (500); 17º – Gazeta Mercantil (484); 18º – Eucatur (480); 19º – Companhia de Saneamento Ambiental do Mar (475); e 2º – Banco Bradesco (465).
“Então” – como realça o consciente e bravo resistente Mário Montanha Teixeira Filho –, “os empresários, grandes condutores do progresso do País, protagonizam um calote dessa envergadura e nós, trabalhadores explorados pela iniciativa privada ou barnabés, é que recebemos a conta para pagar”.
“Pior” – emenda o Da Montanha –, “com um corte brutal de direitos e na supressão da expectativa de aposentadoria, que, mais do que legítima, é uma conquista civilizatória”.
Pior ainda – digo eu: no jogo da manipulação e falsidade, ganha destaque a imprensa nossa de cada dia, que oferece fôlego para mais essa impostura. Lamentável.