A fotogenia de Requião

Quem guarda, tem. Folheando alguns guardados, me deparei com uma entrevista do poeta, escritor e publicitário Jamil Snege. Em abril de 1988há 19 anos, portanto – o poeta envergava a casca de publicitário e revelava a “fotogenia intelectual” do governador Roberto Requião, de quem era um dos amigos mais próximos.

“Jamil, cigarra de várias cascas”, era o belo título da jornalista Adélia Maria Lopes. Nós dois editávamos o caderno Almanaque, deste O Estado do Paraná, de onde retirei esse oportuno guardado.

Na casca de publicitário, Jamil Snege trabalhou para o ex-prefeito Jaime Lerner; fez campanhas para os ex-governadores José Richa, Alvaro Dias e Roberto Requião; e quase elegeu o mais que complicado Tony Garcia senador da República. Essa rica experiência provocou a nossa pergunta: “O que é vender a imagem de um político?”.

Jamil – “Acho que todo elemento, qualquer político, tem um lado realmente aproveitável, porque é um indivíduo. Tem um lado bom. Até Jânio Quadros, figura controvertida, com gestos absolutamente infantis, de prima dona, tem sua dignidade. É uma figura interessante. (…) Então é aí que acho que está o lado importante da propaganda política: você demonstrar ao cliente – no caso o governante – qual é o melhor dele, a fotogenia intelectual dele.

(…) “O Alvaro Dias tem um dado que o Requião não tem. O Requião é devassado como administrador, se expõe, é capaz de irromper na Boca Maldita metendo o pau nos donos do transporte coletivo para um monte de gente que não tem nada com isso. O Alvaro (governador em 1988) tem uma certa… opacidade de poder, que eu chamo. É um sujeito polido.

(…) Ele (Alvaro) sempre foi assim, mas existe um feeling aí. Eu diria que o Jaime Lerner também se enquadra nisso. Chegava na Boca com sua camiseta esporte – foi realmente o cara que quebrou aquele rigor do governante encasacado. A imagem moderna do administrador, foi o Jaime quem fez no Brasil. Muito bem, chegava com suas frases de efeito – todo mundo sabe que é um grande frasista – simpático, cumprimentava as pessoas, dizia uma piadinha, sorria. Não levava qualquer problema da administração pública à praça pública. Tinha essa barreira, se conduzia realmente como prefeito. Acho que essa opacidade é muito importante, o poder não pode ser desmistificado, absolutamente. O governado não pode perceber que o governante se descabela com um problema. Ele tem que mostrar uma certa fleuma, frieza, contenção, uma concentração no trato das coisas. (…) Já tive oportunidade de falar isso a ele (Requião), mas não surgiu efeito algum, absolutamente.

(Exemplo típico do comportamento de Requião foi ter dito, na Boca Maldita, que não iria mais contratar mulheres recém-casadas, só laqueadas, pela licença-maternidade. Foi publicado e gerou grande problema.)

“É, exemplo típico de uma piada, que o Requião é um piadista. A imagem que ele passa, na televisão, é a mais agradável dele. Sou seu amigo pessoal, vocês também o conhecem há tempo e ele tem lances muito engraçados, é um gaiato. É um humorista, sujeito sardônico, sarcástico. Mas ele quer passar aquela imagem de excessiva austeridade.

(Ele sempre foi assim, ou mudou alguma coisa, enquanto prefeito?)
“Tornou-se um pouco mais amargo, posso dizer. Com aquela ironia amarga, não é uma boa ironia.”

“Gaiato, era capaz de contar histórias inventadas a respeito de figuras conhecidas, hilariantes. E ele envenenou esse lado com uma ironia amarga, já dirigida contra seus adversários.”

Dante Mendonça [22/04/2007] O Estado do Paraná

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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