Está chegando às livrarias “Luta e Memória” organizado pela professora Maria Ciavata. Nele está contada a história de três mulheres que, nos anos 70, salvaram o arquivo de Astrojildo Pereira, um dos fundadores do Partido Comunista Brasileiro. Marly Vianna, Zuleide Faria de Melo e Dora Henrique da Costa montaram aparelhos clandestinos no Rio e em São Paulo para preservar o acervo guardado em 47 caixotes e conseguiram mandá-lo para a Itália, onde ele ficou até 1992, quando voltou ao Brasil. É uma história à espera de um filme.
Aos 73 anos, Astrojildo Pereira passara três meses na cadeia, em 1964, e morrera pouco depois. Seu arquivo com parte da história do movimento operário brasileiro foi guardado pelo Partido Comunista. O maior interesse de Astrojildo era a literatura e ele foi o “adolescente de 16 ou 18 anos” que Euclides da Cunha viu chegar à casa de Machado de Assis na noite em que o “Bruxo” agonizava. Beijou-lhe a mão e foi-se embora.
Em 1971, a direção do partido temeu pela segurança do acervo e pediu à professora Marly Vianna que conseguisse um novo abrigo, em São Paulo. Os caixotes foram para um pequeno apartamento.
Estava tudo bem até que, em março de 1974, a ditadura resolveu cair em cima do Partidão. Favorecidos pelas regras de segurança frouxas dos comunistas, em poucos meses capturaram quase toda sua direção, matando doze pessoas. Num lance, José Salles, o marido de Marly, com outros dois capas-pretas a bordo de sua Variant, viu que estava sendo seguido. Desvencilhou-se, mas restava um problema: o carro havia sido comprado numa oficina mecânica próxima ao apartamento onde estava o arquivo.
Em agosto, “fiscais do Detran” chegaram ao apartamento. Era a polícia. (A essa altura mais três dirigentes do PCB haviam desaparecido, para nunca mais serem vistos. As casas de outros dois haviam sido visitadas por estranhos.) Avisada, em três dias Marly transferiu o arquivo e, quando a polícia voltou ao apartamento, estava limpo. Vinte caixas com o acervo político foram para o Rio e ficaram sob a guarda de Zuleide Faria de Melo.
Cinco anos depois da chegada das caixas ao Rio, Dora Henrique da Costa, que vivia na França, veio ao Brasil para cuidar da viagem da papelada para a Itália, onde ela seria preservada na Fundação Giangiacomo Feltrinelli, em Milão. Os baús viajaram de navio e o acervo só voltou ao Brasil em 1992.
Hoje, o Arquivo Astrojildo Pereira está bem guardado e acessível, na Universidade Estadual Paulista.
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DORA E O RESGATE DO SECRETÁRIO GIOCONDO
Antes de embarcar os baús de Astrojildo Pereira, Dora Henrique da Costa participou de um resgate bem mais arriscado. Em 1976, a “tigrada” já havia decapitado o Partido Comunista, mas não conseguira pegar seu secretário-geral, o baiano Giocondo Dias. Dois anos antes, quando sua casa foi visitada por “ladrões”, ele sumiu de todo, tanto da polícia como do PCB, perigosamente infiltrado.
Dora vivia na França e lá, com Marly e José Salles, montou-se um plano para tirar Dias do Brasil. Onde ele estava? Não sabiam. Dora chegou a uma militante que trabalhava no consultório da psicanalista Helena Besserman Viana (a mãe do Bussunda). O tiro foi certeiro. Giocondo deveria ir a um ponto, sem nada nas mãos. Dora passou de carro, abriu a porta e ele entrou. Com um passaporte argentino falso, atravessou a fronteira e, de Buenos Aires, tomou um avião para Genebra, onde Dora o esperava. (A história é bem mais complicada, mas está contada no livro).
Dias voltou ao Brasil com a anistia de 1979 e morreu em 1987, aos 73 anos.
Dora, Marly e Zuleide estão aí e contaram suas histórias.
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DILMA SAIU DA UTI
Um ano depois de ter detonado sua base parlamentar, a doutora Dilma saiu da UTI. Desativou duas pautas-bomba montadas pelo deputado Eduardo Cunha e conseguiu manter os vetos que impôs a um carnaval de despesas que custariam R$ 45 bilhões ao Erário nos próximos anos. Além disso, desarmou a manobra de Lula para derrubar logo o ministro Joaquim Levy.
A doutora deixou de ser a bola da vez e, no seu lugar, está agora Eduardo Cunha, lutando pela sobrevivência política e, à espera do STF, pela liberdade.
Pelo andar da carruagem, 2015 já acabou e 2016 começará depois do Carnaval, ou da Semana Santa, talvez depois da Olimpíada de agosto. Quem sabe, depois da eleição municipal de outubro, às portas de 2017. Até lá, ela pode ficar fora da UTI.
DILMA NA UTI
A doutora Dilma parece gostar de UTI.
Na quarta-feira da semana passada, ela convidou a bancada do PDT para jantar no Alvorada. O encontro ajudaria a azeitar as relações do governo com o partido. Alguns comensais chegaram na hora e foram recebidos por um mestre de cerimônias. Ele lhes disse que a dona da casa estava ocupada. Serviu-lhes uns petiscos e tchau tchau.
Desde 1961, quando Jânio Quadros mandou deixar as malas de Carlos Lacerda na portaria do Palácio com a informação de que deveria dormir em outro lugar, não há notícia de coisa parecida.
Melhor fez Francisco Campos, ministro da Justiça do Estado Novo. Como um chato insistisse em convidá-lo para almoçar, marcou o dia e não foi, mas mandou um oficial de gabinete. Foi explícito, com um toque de ironia.
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ELETROSURINAME
A Eletropaulo criou o apagão tecnológico. Numa boa iniciativa, há alguns anos a concessionária de energia da cidade de São Paulo instalou uma caixa de luz nos imóveis de seus fregueses, permitindo-lhes comprar energia com um telefonema e a digitação de um código num teclado. O cidadão paga adiantado, mas tudo bem.
Há alguns meses, esse avanço começou a ratear. O sujeito paga, o quadro enguiça e vai-se embora a energia. A vítima pode ficar sem luz por três dias. Num caso, foram necessários seis telefonemas, ao fim dos quais chegou o socorro, fazendo um “gato” legal. Como em alguns casos o “gato” fica ativo por meses e o cidadão nada paga, a empresa fica no prejuízo por causa do seu mau atendimento.
Os çábios da concessionária criaram um mecanismo no qual convivem uma tecnologia do século 21 com um serviço do 19. Nele, perdem todos. Felizmente, ela perde algum.
EREMILDO, O IDIOTA
Eremildo é um idiota e soube que o líder do governo no Senado, Delcídio Amaral (PT-MS), quer usar a nova Lei do Direito de Resposta para esclarecer notícias baseadas em depoimentos do lobista Fernando Baiano à Justiça vinculando-o a petropixulecos.
Ex-diretor da Petrobras até 2001, Delcídio foi acusado por Fernando Baiano de ter recebido pelo menos US$ 1 milhão em 2006 para uma campanha eleitoral, no lance da compra da refinaria de Pasadena.
O cretino acha que o senador está muito certo, mas não sabe o que ele poderá acrescentar, pois já considerou a acusação “absurda”.
Eremildo, como a doutora Dilma, não confia em delator.
Elio Gaspari – Folha de São Paulo