A lição das zebras.

As zebras, vejam vocês, não sofrem de estresse. É a conclusão a que acabam de chegar cientistas e zoólatras após demorada observação nas savanas africanas desses tão sedutores quanto misteriosos animais.

E sabem por que a cuca fresca das zebras? Por uma razão muito simples: ao contrário de outros bichos, principalmente o bicho homem, não sofrem de véspera. Isso mesmo, leitor – os observadores detectaram que a zebra não fica, por exemplo, de orelha em pé, a sofrer, com antecedência, o eventual ataque do leão.

Segue o listrado eqüino a pastar docemente lá a sua grama, sem se importar se existem ou não leões no mundo. O que é saudável conduta, garantem os cientistas, já que, neste momento, alheias ao alarme do corpo, as zebras “economizam”, digamos, seu sistema de defesa contra os predadores.

Os resultados são notáveis. Sem o desperdício – de resto desnecessário – dos hormônios defensivos, sobretudo a adrenalina, safam-se dos perigo reais com eficiência máxima. Não sobrecarregam o organismo baixo a sempre corrosiva ansiedade. Que, sabemos, inferniza a vida de nove entre dez animais da Floresta – de seres humanos a peixes; de elefantes a lagartixas.

Já percebeu aí, o leitor, como é que é a vida da lagartixa? Olhos tensos, alerta ao menor ruído ou movimento, muito mais preocupada com a própria pele – se podemos chamar de pele a película transparente que a reveste -, do que propriamente com a presa ao imediato alcance da língua. Um mau negócio, sem dúvida, para elas ou para qualquer outro bicho que se preze. Aos humanos, então, nem se fala – deixamos de viver o presente para nos aferrar a imaginários perigos futuros.

Já dizia Guimarães Rosa, autor do seminal Grande Sertão: Veredas, que viver é muito perigoso, mas daí a nos mantermos vigilantes feito serpentes atocaiadas, receosos, ao acordar, do que possa sobrevir antes mesmo de escovar os dentes, é burrice e crassa neurose. Ou, bem mais freqüente, as duas coisas juntas…

Pior: rigorosamente inútil. Não será a adrenalina de agora que há de nos defender da adrenalina, alguma vez necessária, sem dúvida, que seremos obrigados a destilar daqui a pouco… Também as zebras não dispensam a adrenalina, só que a utilizam para correr – e escapar -, na hora certa…
Os budistas têm uma expressão, em japonês (como é mesmo Claudio Seto?), que o saudoso Paulo Leminski, orientalista de prestígio, costumava citar no original, com a não pouca erudição que era sua maior marca: “A vida se dá num imenso, inenarrável e infinito presente”. Futuro e passado são decantadas ilusões – um porque ainda não aconteceu, e, portanto, não existe; o outro, porque já o devorou a voragem do tempo e nem Deus o traz de volta.

O melhor do mundo é o aqui e o agora. Não custa tentar, não é mesmo? Até as zebras, estas primas da mula e do cavalo, conseguiram, por que não vamos conseguir nós, os humanos? Que alcançamos chegar, entre outras, a Leonardo da Vinci ou à filosofia de Heiddeger e Spinoza, sem falar de quase impensáveis façanhas, cá embaixo ou no Cosmo, ainda mais extraordinárias…

Wilson Bueno [07/05/2006] O Estado do Paraná.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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