“Afinal, o que você veio fazer em Casablanca?”, pergunta o chefe de polícia Claude Rains a Humphrey Bogart em “Casablanca” (1942). “Vim por causa das águas”, ele responde. “Que águas? Estamos no meio do deserto!”, espanta-se Rains. E Bogart, com cara de pôquer: “Fui mal-informado.” É um dos grandes diálogos do filme e faz sentido.
Mas fará sentido a sequência final, no aeroporto, em que Bogart fuzila o vilão nazista Conrad Veidt e, ao som de “As Time Goes By”, embarca sua amada Ingrid Bergman no avião com o marido dela em meio a um tremendo fog? Existe fog no deserto? E como explicar os ventiladores de teto que rodam devagarinho durante todo o filme? Eles produzem vento àquela velocidade?
Claro que faz sentido. O cinema não é a vida real. A sequência final sem fog não teria o mesmo romantismo. Quanto aos ventiladores, tente filmar um rodando à velocidade normal —as pás desapareceriam ao girar. E a sequência em que o herói antifascista Paul Henreid rege os clientes do bar de Bogart, que cantam a “Marselhesa”? De quantos músicos se compõe a banda? De não mais que uns seis ou sete. Mas, à medida que o bar inteiro começa a cantar, o som em off na trilha sonora se torna o da baita orquestra da Warner, com 60 ou 70 figuras. E está certo. Só com essa massa sonora se tem ideia da grandeza daquele momento.
Na primeira e melhor versão de “King Kong” (1933), a mão do macaco que faz virar um trem do metrô elevado de Nova York e lhe permite escalar o Empire State é a mesma que encolhe e entra pela janela para capturar a pobre Fay Wray e despi-la véu por véu. E por que não? A lógica de “King Kong” é a de um pesadelo, e pesadelo não tem lógica.
Falando em lógica, como a valente Diadorim, nos vários filmes que se fizeram de “Grande Sertão: Veredas”, consegue se passar por homem junto aos jagunços se, durante anos, nunca é vista fazendo xixi em pé?