Uma formula clássica do humor é a frase invertida. Pegue uma frase-feita e escreva-a ao contrário. Entre nós, um mestre dessa especialidade foi Millôr Fernandes. São dele alguns dos melhores exemplares do gênero: “O rabo escondido com o gato de fora”, “À noite, todos os pardos são gatos” e, para mim, a melhor: “O navio abandonou os ratos”.
Millôr escreveu-a em 1963, ao falar de sua saída de “O Cruzeiro”, onde passara 25 anos e do qual fora um dos esteios. Neste caso, a frase se aplicava: Millôr era um exemplo de honestidade numa empresa que, a começar pelo patrão Assis Chateaubriand, não se caracterizava pela ética. Na prática, o navio –Millôr– se salvou, e os ratos rapidamente se afogaram. Em 1965, já não havia nenhum à tona.
Ao ler o noticiário sobre as ameaças de defecção no PT, é difícil saber quem está abandonando quem. O discurso é o de que o partido “traiu suas propostas”. Na verdade, a cada petista carimbado que cai na rede da Operação Lava Jato e com o próprio chefe –Lula– tendo dificuldade para se explicar, fica difícil aos remanescentes contemplar seu próprio futuro nas urnas. Como chegar a estas numa canoa fazendo água? Daí os senadores, deputados, prefeitos e até vereadores que estão se mexendo para mudar de partido antes que a lei eleitoral os impeça de disputar as próximas eleições.
O PT se tornou um terreno tão pantanoso e insalubre que, há dias, escapou a informação (naturalmente, desmentida) de que até a presidente Dilma Rousseff cogitou trocá-lo por uma coligação suprapartidária. O que seria apenas uma autodefesa: Dilma não gosta do PT, nem o PT, dela. É inédito: o governo e o partido pago para apoiá-lo só se toleram porque não têm alternativa.
Em política, pode-se viver num navio infestado de ratos. Desde que ele não esteja indo a pique.