Abobrinhas

Aprendi uma nova palavra e fui logo vestindo a carapuça: “frinfronar”, conhece? É uma espécie de “procrastinar” versão tapuia. O som de “procrastinar” já denuncia uma certa urgência prussiana, como se preguiça fosse delito grave.

Frinfronar é nosso. Está mais para “deixar para depois”. Quem fica no frin, fron, frin, fron, enrola. Finge que faz sem resolver a parada.

Nestes tempos fervidos, frinfroneadores de marca, ases do descaramento, discutem os grandes temas nacionais com pompa.

Acompanhe: a turma cujo alcance mental só consegue fomentar elucubrações do tipo: “um beagle equivale a uma dúzia de galinhas” vislumbrou uma vitória retumbante ao destronar Jair Bolsonaro da presidência da Comissão de Direitos Humanos da Câmara. Palmas! De fato, simbolicamente é positivo ver o deputado nocauteado.

Mas cá entre nós: quem é Jair Bolsonaro? Representa ameaça real ou é figura folclórica, um Eduardo Suplicy às avessas, com show itinerante para um público cativo a fim de garantir mandato?

No caso dos beagles, pessoal frinfronou porque é bem mais bacana carnavalizar e quebrar laboratório do que calcular que ainda temos de comer muito feijão e arroz em investimento e tecnologia antes de abrir mão da pesquisa com animais.

No caso de Bolsonaro, o princípio é o mesmo. Dá prazer vê-lo derrotado. Duro é entender que o deputado serviu de boi de piranha em uma manobra banal. Até o episódio Feliciano, ninguém queria presidir uma comissão que nunca aprova nada nem vê verba. Mas, agora que as minorias estão de olho nos Direitos Humanos, ela virou moeda de troca. E deixou as comissões onde está o tutu Transportes, Trabalho etc. livres de atenção do público.

Quer ver outro frin, fron? E se a Dilma recorrer às armas para transformar isto aqui numa Venezuela? Socorro! Estava escrito no jornal, eu vi: “Dilma cogita colocar Exército na rua contra atos na Copa”. Quem te viu, quem te vê!

Mas peralá: na Eco 92 também não tomaram essa precaução? E ninguém ficou perdendo tempo com lamúrias, ficou? Qualquer coisa que o governo do PT faça, o pessoal logo “interpreta”. É impressionante. Por mais inócuo, terá sempre uma “conspiração” por trás.

Aliás, isso não se aplica só ao PT. Nesta semana, o Itaú enviou um calendário aos seus clientes. Nele, o 31 de março consta como “data do aniversário da revolução de 1964”. Pois bem. Analise com carinho e em partes o grau de frinfronagem: para metade da torcida do Fla-Flu, quem não chamar o 31 de março de 1964 de “golpe militar”, mas de “revolução”, merece ser empalado em praça pública.

Quem dá esse segundo nome ao acontecimento é a outra metade da torcida, para quem 31 de março de 1964 marca o início do confronto que evitou a instalação de um regime marxista no país.

Acredite se quiser, muita gente esclarecida ficou de vigília aguardando a retratação (que veio) do Itaú. Frin, fron, frin, fron…

Itaú é uma marca, não uma agremiação política. É óbvio que eles evitam frases com potencial de dano de imagem a todo custo. Está na cara que não foi proposital.

Ainda assim, há o que lamentar. É que o que não falta é baiacu que tá nem aí se é golpe, rave, revolução, ou festival da pamonha. Afinal de contas, o que é que isso tem a ver comigo? Acrescenta? Quero mais é terminar logo este calendário aqui na minha frente e me mandar da agência pra dar um pulo no shopping e ver as liquidações. Frin, fron, frin, fron…

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Barbara Gancia – Folha de São Paulo(21/02/2014)

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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