Adriana me escreve perguntando se eu “pago paixão” com facilidade e conta não se conformar “com amigas que voltam para casa profundamente envolvidas após um terceiro encontro”. Curioso como aqui em São Paulo, onde temos a fama de pensar muito em dinheiro, não existe a tal expressão que combina paixão com passar recibo. O ato de pagar paixão, ainda me recordo bem dos meus 30 anos, é carioquíssimo.
Quando morei no Rio de Janeiro, e via um rapaz parecido com o Humberto Carrão a cada meia esquina, entendi que poderia me apaixonar umas 40 vezes por dia, durante minhas caminhadas do Leblon até Copacabana.
Confesso que minha obsessão clínica é mais o verbo “durar”. Falo toda semana na terapia sobre meu desejo de um encontro inabalável, contínuo, onde eu ainda possa florescer por muito tempo e um dia morrer saciada de histórias e sentidos. Se ficou brega peço perdão.
Mas paixão, eu tenho a sorte (e aos olhos de muitos amigos, a insanidade) de sentir o tempo todo. Em algumas fases da vida, me apaixono por duas, três, ou quatro pessoas ao mesmo tempo. Sempre saio de reuniões, aniversários, almoços, entrevistas, apaixonada por alguém. Claro que as durações vão de segundos a anos, a depender se estou apenas usando as costas do outro como tela de projeção ou se existe de fato um ser interessante que possa parar de pé após alguns dias. Não digo que vivo real e carnalmente nem 1/100 dessas fantasias, mas não saberia aturar os dias não fosse essa minha capacidade de
almejar a pele alheia.Me apaixono por novos amigos, me apaixono pelas pessoas com quem trabalho, me apaixono por duas linhas de papo em uma mensagem enviada. E não é aquele papo hippie de amar a tudo e a todos, as plantas, os bichos, eu falo de desejar lamber com afinco a face de seres humanos. Do coração bater descontroladamente em diferentes partes do corpo. Uma amiga diz que deveriam fazer um spray com a minha libido e vender na Fornicari (uma sex shop caríssima com um nome baratíssimo).
Já me aconteceu de sair para chorar as pitangas sobre uma paixão avassaladora com um colega e, no meio do choro, me perceber completamente apaixonada pelo ouvinte querido que me devolve ironias e intensidades como se estivéssemos em um jogo de tênis, tudo isso enquanto recebo uma mensagem inteligente e picante de um terceiro e, suspirando, me dou conta que poderia viver algo ardente com um desconhecido na mesa ao lado.
Essa é a história que eu poderia contar semanalmente ao meu analista, concluindo, em voz alta, que no fundo, quem eu realmente desejo, é ele. Sou sempre assim? Não. Passo longos períodos liberta de uma espécie de estado maníaco apaixonante, mas quando sou, aproveito, ainda que exausta.
Entendo que a pergunta de Adriana quer ir um tantinho mais além, e entender se me derreto e declamo para as pessoas. Sim, não tenho vergonha de ser ridícula e nem medo de afugentar rapazes com meu aceleramento desarrazoado.
Lembro de um jovem de barba ruiva que ouviu meus sussurros implorando “passaria a vida com você” e ele estava na minha casa há duas horas. Eu o conhecia há duas horas e vinte minutos. Ele riu muito e falou “nossa, você consegue pagar paixão assim fácil?”.
No dia seguinte escrevi infinitas crônicas sobre sua barba ruiva e mãos pequenas. Fiquei duas semanas ouvindo músicas e pensando nele. E ele ria muito da minha cara. Bem, semana passada, ele apareceu no lançamento de um livro meu. Queria apresentar para a família a moça de quem ele sempre falava “doida, escreveu vários textos sobre mim”. Eu não lembrava seu nome.