Agrippino (com dois pês mesmo) Grieco nasceu em Paraíba do Sul (Rio de Janeiro), em 1888 e morreu na capital carioca, em 1973. Funcionário público na Estrada de Ferro Central do Brasil, ficou famoso como poeta, contista e principalmente crítico literário. Deixou a Central do Brasil para ser professor de história da literatura na Faculdade de Letras da antiga Universidade do Brasil. Faturava, ainda, muitos trocados, realizando conferências pagas em todo o país. Naqueles tempos, com o rádio incipiente e sem televisão, inúmeros intelectuais viviam disso e reuniam, principalmente nas pequenas e médias cidades, numerosas plateias. Mas Aggripino notabilizou-se mesmo como crítico literário, o mais importante da história do Brasil, ao lado de Alceu Amoroso Lima (Tristão de Athayde).
Caso o autor objeto de suas críticas não servisse para lamber os pés de Machado de Assis ou lustrar os sapatos de Lima Barreto, Grieco era implacável e o escritor apanhava mais do que boneco de Judas na sexta-feira da paixão. Em suas críticas, publicadas sempre aos domingos, n´O Jornal, era mordaz como o Célio Heitor Guimarães, ferino como o Rogério Distéfano e cáustico como o Luiz Antonio Solda. Quando um livro era objeto de sua crítica semanal, o autor se escondia debaixo da cama à espera das chuvas e trovoadas que invariavelmente vinham.
Devotava verdadeiro horror aos parnasianos, brindando o mais famoso deles, o curitibano Emílio de Menezes, com variados impropérios. Certa feita, não contente com o que já havia escrito sobre o mesmo, saiu-se com essa: “Estripando vaidades: Emílio de Menezes num Olimpo de Opereta”.
Outros autores, inferiores ao nosso Emílio, não tinham sorte melhor: “Ele é uma glória literária no Brasil, mas glória no Brasil é ainda a melhor maneira de ser ignorado pelo resto do mundo”, “Panatenia (tatuagem) da imbecilidade”, “Inútil como um tenor resfriado”, “Mais mentiroso que epitáfio de cemitério”, “Era um camelo no Saara das ideias”, “Cobriram-no de adjetivos poéticos, mas ele queria apenas um substantivo prosaico: dinheiro”, “Estava presente em espírito. Ou seja, ausência total”, “Tem um estilo mais engomado que irmã de caridade”, “No dia em que tiver uma ideia, morrerá de apoplexia fulminante”, “Trata-se de um Clóvis Bevilácqua de emergência”, “É um livro raro, mais raro, no entanto, era quem o procurasse”, “A obra é ilustrada, o autor não”, “O livro deveria ser encadernado em pele de jumento, por coerência quanto ao conteúdo”, “Aquele médico deixou de clinicar para escrever um romance. Lucraram os doentes e perdeu a literatura”, “Começou a aprender italiano depois de ter traduzido Dante”.
Grieco não batia apenas em literatos e, volta e meia, se metia na política: “Era um deputado conservador; seu único programa era conservar sua cadeira na Câmara”, “Direita e esquerda são complementares e permanentes. Vitória integral da direita traz congelamento e esclerose. Êxito completo da esquerda traz anarquia e o caos”. “Era um pêndulo, oscilando entre a ignorância e a má fé”, “Insultavam-se mutuamente, e ambos tinham razão”, “Apesar de homem culto, ninguém como ele botou mais solecismos no papel. Era deputado, mas devia ser o taquígrafo da Câmara”.
Até com Ruy Barbosa tinha lá suas diferenças. Reza a lenda urbana que na Conferência de Haia, Ruy, ao dirigir-se à Assembleia das Nações, perguntou em que língua do mundo gostariam que ele discursasse. Foi a glória de Ruy no Brasil, os botocudos de todos os gêneros acreditaram na esparrela. Agrippino Grieco colocou os “pingos nos ís” e explicou aos seus leitores que a referida Assembleia funcionava com dois idiomas oficiais, o francês e o inglês, e que Ruy, que depois da mentira contada acima passou a ser referido pela imprensa e pelo povo como “O Águia de Haia”, apenas havia perguntado em qual dos dois idiomas deveria discursar, recebendo do presidente a resposta de que “em francês ou inglês, o senhor escolhe!”.
Aliás, quando Ruy veio a falecer, instalou-se uma ferrenha polêmica em todos os jornais do Brasil. Os poucos intelectuais de então (muito menor o número deles hoje) se dividiam em duas alas, que se digladiavam pelos periódicos e se insultavam e se agrediam nas ruas. A primeira delas, sustentava que ninguém no Brasil teria estirpe para ocupar a cadeira de Ruy na Academia Brasileira de Letras. A cadeira deveria continuar vaga para sempre. A outra ala era radicalmente contrária, reconhecia que ninguém no Brasil tinha o talento de Ruy, mas que, mal ou bem, a cadeira deveria ser ocupada. Enquanto isso, nenhum escritor tinha coragem para se inscrever à vaga na ABL. Agrippino Grieco guardou obsequioso silêncio sobre a questão, muito embora devidamente instado a se manifestar.
Passado um tempo, com os ânimos mais ou menos serenados, o sergipano, radicado no Rio de Janeiro, Laudelino Freire lançou a sua candidatura. Laudelino tinha lá seus (muitos) méritos, seus artigos jornalísticos foram reunidos em onze volumes. Autor do “Grande e novíssimo dicionário da língua portuguesa”, estudado até hoje por gramáticos do Brasil, Portugal, Angola, Moçambique e etc…
Grieco foi, mais uma vez, implacável. Escreveu, no domingo seguinte ao lançamento da candidatura de Laudelino Freire, que o mesmo, finalmente, iria trazer paz aos intelectuais do Brasil. A sua candidatura satisfazia a ala que queria preencher a vaga de Ruy, já que, ao menos fisicamente, a cadeira estaria ocupada. Por outro lado, também atendia a vontade dos que queriam a cadeira de Ruy vaga para sempre, uma vez que com Laudelino, ela permaneceria espiritualmente vazia. Laudelino Freire, de incontáveis méritos como gramático, nunca mais dirigiu a palavra a Agrippino Grieco.