Podem encontrar-se no quintal, podem comer juntos, não precisam usar máscara. Temos um regime orientado por um protocolo comunitário”, conta. No oásis à margem esquerda do Rio Doce, em meio ao caos sanitário, ele segue alerta para os dramas do mundo, como demonstra na entrevista a seguir.
CartaCapital: Você e os Krenak passam juntos a quarentena. Como tem sido a experiência?
Ailton Krenak: A pandemia não é um evento local. Posso estar sem contágios na minha aldeia, mas há vários casos no entorno. Nos grandes centros urbanos há alguma vigilância. Mas nas bordas do Brasil, na periferia, nas beiradas, no Porto de Manaus, no Porto de Belém, ninguém controla aquele fluxo. Lá na reserva, observamos preocupados. Não adianta nos protegermos se o lado de fora está bagunçado. O recrudescimento da Covid-19 é um risco grave para nossas vidas. Temos consciência, mas tememos que os vizinhos não tenham. Somos uma sociedade do contágio. Por mais que um de nós tome cuidado, sozinho não consegue evitá-lo.
Mantemos nossas famílias próximas, as irmãs, os cunhados, podem encontrar-se no quintal, podem comer juntos, não precisam usar máscara. Temos um regime orientado por um protocolo comunitário, tomamos decisões juntos. Lá não há decisões individuais. Se alguém põe em risco o coletivo, pode sofrer algum tipo de sanção, inclusive posto para fora.