Alcy, o cartunista e a censura

Rio – O poeta Ferreira Gullar, numa conversa com Jaguar, disse que Murilo Felisberto, editor do “Jornal da Tarde”, de São Paulo, estava precisando de um cartunista.  Jaguar escreveu um bilhete para o editor do jornal paulista e mandou o menino procurá-lo. Assim começava a carreira profissional do cartunista Alcy, no final dos anos 60. 

Alcy Linares Deamo,  ou simplesmente Alcy, como ele assina, nasceu em 13 de julho de 1943, em Nogueira, interior de São Paulo e foi criado na capital paulista. Ainda adolescente, deu os primeiros passos no humor gráfico nas páginas do “Pif-Paf”, de Millôr Fernandes.

Já como profissional, trabalhou nos jornais “Pasquim”, “Diário Popular”, “Estado de São Paulo”, “Folha de São Paulo”, “Jornal do Brasil”, “Movimento”, “Versus” e nas revistas “Veja”, “Isto É”, “Exame” e “Senhor”.

Foi um dos cartunistas mais atuantes no combate a censura e a Ditadura Militar. Militante, suas armas eram a coragem, o lápis, o papel e uma ideia na cabeça com as quais criava cartuns e charges demolidoras.

Quando chegou ao Rio, fez parte da “nova geração” do “Pasquim”. Era época da Ditadura Militar. Havia um clima de terror no ar. O medo se instalara e havia sempre a ameaça de alguém ser preso ou sumir.

Alcy conta que o Ziraldo dava aos cartunistas novos – Alcy, Nani, Reinaldo, Hubert… – um cartão com o nome e o telefone de um advogado para ligarem caso algum deles sumissem.

A censura ferrenha e implacável obrigava os cartunistas e jornalista a produzirem o dobro do material necessário para fechar uma edição do jornal. A maior parte do que era produzido, era censurado. “A gente desenhava para caramba, no sentido de quantidade, para encher o saco e dar mais trabalho para os censores”, lembra o cartunista.

Como ilustrador, realizou capas para os livros dos escritores Luis Fernando Veríssimo, Carlos Eduardo Novaes e Stanislaw Ponte Preta. É autor de vários livros, entre eles: “O dia em que eu fiquei sabendo”, “Papai e mamãe estão se separando” e “Meio dia macaco assobia”. Em 1974, fez parte, junto com Millôr, Ziraldo, Zélio, Fortuna, Jaguar e Ciça do grupo que apoiou a criação do Salão Internacional de Humor de Piracicaba que se tornaria referência mundial no desenho de humor.

Desde que saiu do jornal “Lance”, no final dos anos 90, Alcy vem se dedicando a ilustrações para livros infantis. “São dois movimentos. Um é meu, o outro é da realidade. Fui ficando de fora do meio e, quando vi, estava fazendo mais para editora do que para jornal”, disse.

Recentemente, Alcy ganhou uma retrospectiva com alguns de seus cartuns feitos para a imprensa e vetados pelos censores da época.

O livro “Vida de Artista”, lançado pelas editoras Jacarandá e Devir, é um apanhado de seu trabalho feito com graça inteligente e de poucas palavras, numa época de censura e ditadura, publicados entre 1970 e 1984.

Com prefácio do jornalista Gonçalo Junior e orelhas dos irmãos Chico e Paulo Caruso, o livro reúne charges e cartuns sobre temas diversos publicados entre 1970 e 1984, período em que colaborou com os mais importantes veículos da imprensa brasileira.

“É o único cartunista profissional que eu conheço”, crava Chico Caruso.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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