As pedras da louca

As pedras da louca não estão mais lá. Umas viraram pó, outras estão no meio do caminho. As pedras da louca foram atiradas na vidraça do vizinho e nos telhados de vidro da prima que a louca não gosta.

As pedras da louca são preciosas, nenhum dinheiro compra. A louca rasgaria o dinheiro. A louca quer os elásticos que amarram o dinheiro. Muitos elásticos, rápido, para a louca voltar pra casa.

A louca quer de novo todas as pedras – chega de desordem. Ela quer todas as pedras reunidas para ela saber qual é a primeira, qual é a última. A primeira, para atirar no rei: bem na grimpa do rei. A última, para guardar em casa, muitíssimo bem guardada, aonde só ela sabe.

Nada vai adiantar querer da louca alguma pedra. Ele dirá que não tem nenhuma. Ou nada dirá. Nada dirá. As pedras da louca querem voltar a ser pedras brilhantes. Para ladrilhar a rua, cujo dono é a louca. Aquela rua onde o amor da louca vai passar. Vai passar. E não queira você saber qual, a rua da louca. Ninguém nunca saberá. Que se danem os poetas, que se danem as águas: é pau, é o fim do caminho: de janeiro a janeiro corre o rio tietê.

Não haverá mais sopa de pedra. A louca vai recolher todas, uma por uma. Até aquela do tamanho do mundo, diz a louca. E se alguém quiser bater na louca, pegar na louca, exigir dela uma pedra, ela dirá: – tá bão…tá bão, minha pedra é o mundo, leve pra casa então; e vê se me deixa em paz.

Das pedras da louca, não adianta, só a louca sabe. As pedras da louca não estão mais na parede, nem no chão, nem no céu. Elas estão escondidas, onde só a louca sabe. As pedras da louca estão no mundo. É o mundo. Leve pra casa, então.

(Ewaldo Schleder, loco de piedra)

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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