“Eu lhe dei 20 mil réis/ Pra tirar três e trezentos/ Você tem que me voltar/ Dezessete e setecentos.” O baião de Luiz Gonzaga e Miguel Lima, um clássico de 1958, pode ajudar a entender a prestação de contas do governo Bolsonaro para o ano de 2022, aprovada “com ressalvas” na semana passada pelo Tribunal de Contas da União. “Ressalvas” porque, segundo o relatório do TCU, há uma “relevância de distorções” no valor de R$ 1, 28 trilhão. O que são “distorções” de tal “relevância”, só o Sombra sabe. Mas o valor distorcido exige tradução para o português: 1 trilhão e 280 bilhões de reais. Não é pouca distorção.
O relatório acusa o “reconhecimento indevido de receitas com impostos, de reversão de provisões e de ajustes para perdas e ganhos com a reavaliação de ativos” e o “não reconhecimento de desincorporação de ativos, de obrigações com a Previdência Social e com os estados e de ajustes e reservas no patrimônio líquido da União”. O que isso quer dizer, talvez nem o próprio Sombra saiba. O que se deduz é que o governo Bolsonaro deixou uma bagunça de contas no valor de 1 trilhão e 280 bilhões de reais.
E por que não? Bolsonaro passou quatro anos em função exclusivamente de sua reeleição, drenando os cofres públicos para subornar militares, agradar o Congresso e comprar o voto dos pobres. O governo em si ele deixou para os traficantes de vacinas, passadores de boiadas e vendedores de Bíblias. Se Bolsonaro fez o que fez com a saúde, o meio ambiente e a educação, o que não faria com as contas do governo?
Não é um caminhão de dinheiro mal explicado. É uma frota de caminhões. Mas talvez não signifique muito, já que os juízes do TCU seguiram por unanimidade o voto do relator Jorge Oliveira, aliás, indicado por Bolsonaro para o tribunal.
O relatório irá agora para julgamento no Congresso, especialista, como sabemos, nos dezessete e setecentos.