O presidente Jair Bolsonaro está preparando seu próprio ‘6 de janeiro’, referência à invasão do Capitólio por manifestantes trumpistas. A análise é do autor americano Brian Winter, editor-chefe da revista Americas Quarterly.
Winter lembrou as críticas de Eduardo Bolsonaro à invasão trumpista. No começo de março, o deputado disse ao Estadão: “Foi um movimento desorganizado. Foi lamentável”.
E acrescentou:“Se fosse organizado, teriam tomado o Capitólio e feito reivindicações que já estariam previamente estabelecidas pelo grupo invasor. Eles teriam um poder bélico mínimo para não morrer ninguém, matar todos os policiais lá dentro ou os congressistas que eles tanto odeiam. No dia em que a direita for 10% da esquerda, a gente vai ter guerra civil em todos os países do Ocidente”.
Eduardo esteve na Casa Branca em 5 de janeiro, um dia antes da invasão trumpista.
Dois dias depois da invasão do Capitólio, o próprio Eduardo publicou no Twitter uma foto com Jared Kushner, genro e assessor de Donald Trump, com a legenda: “Prazer ser recebido na Casa Branca, ainda que rapidamente, por Jared Kushner, responsável por tantos acordos de paz no Oriente Médio.”.
Para Winter, “[o] dramático reembaralhamento do ministério do presidente Jair Bolsonaro nesta segunda-feira parece desenhado para evitar um destino similar – organizar-se agora, e evitar ser ‘ilegitimamente’ removido do cargo depois. Embora isso possa parecer para alguns papo de conspiração, é uma reação lógica a eventos recentes no Brasil, incluindo o pior surto no mundo de mortes por Covid-19, uma renovada ameaça de impeachment pelo Congresso, e a emergência inesperada do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o pesadelo ambulante da direita brasileira, como forte desafiante na eleição de 2022″.
“O outrora ‘Trump Tropical’ está determinado a evitar o que percebeu como erros de seu ídolo”, acrescenta Winter.
Para o autor, não está claro se o esforço de Bolsonaro vai funcionar ou sair pela culatra. Não se sabe se os novos comandantes das Forças Armadas serão ainda mais leais ao presidente ou o deixarão mais fraco.
“O plano B de Bolsonaro é claramente ter o maior número possível de homens armados ao seu lado para o possível evento de um impeachment ou resultado adverso na eleição de 2022 (…) Uma das lições mais importantes do 6 de Janeiro nos Estados Unidos foi escutar com cuidado quando aspirantes a autocratas dizem quem eles são e o que planejam fazer. Saudades da ditadura e ódio à esquerda ‘comunista’ foram as únicas linhas consistentes da carreira política de mais de 30 anos de Bolsonaro”, escreve Winter.
E acrescenta: “Apenas nas últimas semanas, o presidente alertou sobre possível fraude nas eleições de 2022, referiu-se ao Exército como ‘meu’, empurrou decretos para permitir armas aos seus apoiadores, e disse a uma turma de cadetes militares que ‘se tudo tivesse que depender de mim’, o Brasil viveria um sistema político diferente, presumivelmente autoritário”.
O motivo para ter demorado tanto a reconhecer a vitória de Joe Biden, diz Winter, pode ter menos a ver com afinidade ideológica e mais com um olho no futuro incerto.