Bicho líquido de fiel transparência, as chuvas chovem no zinco de nosso teto humilde com a graça quase invisível de ariscas lagartas, e mínimas, muitas, coleantes, uma que vez cândidas.
Quis no verão sua morada, e o ímpeto com que serpenteia da nuvem ao telhado e dali às caleiras da casa, ninho suspenso entre o arrozal e as águas.
Há, contudo, diversas espécies de chuva — de chuviscagens a chuvões, veros maremotos, bebendo a Terra, rios e lagos, riachos e cascatas.
Se me sugas feito um vício eu sou a chuva que teu chão lambe com uma volúpia de amantes entranhados – um no outro encharcados até a última gota e a derradeira raiz mais chã.
Lavas-me o rosto a esguichos; brinco de intempérie sobre o vosso ventre. Líquidos e miasmas, cobrem meu corpo vossas mágoas. Águas? Cantam as calhas nosso lamento, longe, enxurrada em lá maior, aguaceiro, coral de anilhas.