Entre os longas disponíveis estão produções da Atlântida e Vera Cruz
A retomada das atividades da Cinemateca Brasileira, paralisadas por 16 meses pela indefinição do governo Bolsonaro sobre a administração do local, incluiu, além da reabertura e da volta da programação presencial, o retorno do BCC (Banco de Conteúdos Culturais), site do órgão que reúne 66 mil materiais, entre filmes, fotos, cartazes e outros documentos relativos à produção audiovisual nacional. Tudo pode ser consultado e assistido de graça.
Sob gestão da SAC (Sociedade Amigos da Cinemateca), o órgão reabriu as portas ao público no último dia 13 de maio. A data culminou o processo de retomada da Cinemateca, iniciado em novembro de 2021, quando a SAC assinou o contrato de gestão com a Secretaria Especial de Cultura.
Na esteira do abandono da Cinemateca pelo governo, o BCC ficou fora do ar entre outubro de 2020 e um dia antes da retomada dos trabalhos, no final de de 2021. “Em algum momento, provavelmente por falha de energia, o servidor que mantém o Banco de Conteúdos Culturais caiu e ficou desligado até novembro do ano passado, quando a área de tecnologia da Secretaria de Cultura conseguiu reativá-lo”, afirma Gabriela Queiroz, diretora técnica da Cinemateca.
Apesar desta retomada, o BCC teve de esperar para ser atualizado. “Até março, nossa prioridade era o acervo físico, as estruturas prediais, os laboratórios, os depósitos. Tivemos de fazer um diagnóstico da situação e ver o que era prioridade. Uma delas era a revisão dos filmes em nitrato de celulose, finalizada em março. Temos 3.000 rolos, é a coleção mais antiga e mais frágil da Cinemateca, pois há o risco de autocombustão. Ela não tolera descaso.”
A primeira atualização do BCC aconteceu em abril, quando 300 fotos de personalidades, como Alberto Cavalcanti, Humberto Mauro e Eva Wilma, foram acrescentadas ao acervo digital. “Foi o possível no momento de reestruturação. A partir de maio, a ideia é atualizar o conteúdo mensalmente, com filmes, fotos, cartazes”, diz Gabriela.
- Alguns filmes disponíveis
- ‘Caiçara’ (1950)
- ‘Terra é Sempre Terra’ (1951)
- ‘Appassionata’ (1952)
- ‘Sai da Frente’ (1952)
- ‘Carnaval Atlântida’ (1952)
- ‘Amei um Bicheiro’ (1952)
- ‘A Dupla do Barulho’ (1953)
- ‘O Homem do Sputnik’ (1959)
- ‘O Cangaceiro’ (1953)
- ‘Floradas da Serra’ (1954)
- ‘É Proibido Beijar’ (1954)
- ‘Nem Sansão Nem Dalila’ (1954)
- ‘Barravento’ (1961)
- ‘Deus e Diabo na Terra do Sol’ (1964)
- ‘Terra em Transe’ (1967)
- ‘O Dragão da Maldade’ (1969)
- FORA DO STREAMING CONVENCIONAL
Iniciativa pioneira, o Banco de Conteúdos Culturais foi criado em 2009, mais voltado para pesquisadores. Mas isso não impede que o público em geral aproveite o acervo, disponibilizado gratuitamente. Nele é possível assistir, por exemplo, produções da Vera Cruz e da Atlântida, obras que não estão disponíveis nos serviços de streaming convencionais. Há ainda filmes de Glauber Rocha e também programas e novelas da extinta TV Tupi.
O rigor técnico da catalogação da Cinemateca, pensado inicialmente para o mundo acadêmico, é um prato cheio para quem gosta de cinema e quer saber mais sobre o filme que acabou assistir. No BCC, o espectador pode conferir a ficha técnica completa da obra, que traz dados como quem produziu o filme, sua duração, os nomes da equipe e do elenco, o circuito exibidor e dados de censura.
Todos os materiais possuem uma marca d’água da Cinemateca para proteção dos direitos autorais, mas isso não é obstáculo para aproveitar os longas. Segundo Gabriela, o objetivo agora, com a retomada das atividades da Cinemateca, é aprimorar o serviço.
“O BCC não é um streaming, mas pode chegar lá. Precisamos fazer investimentos em tecnologia para melhorar a resolução dos filmes e criar funcionalidades que deem mais proteção ao conteúdo. Mas, principalmente, precisamos investir no trabalho interno, em catalogação, processamento e digitalização das obras”, diz Gabriela.
Os números do BCC
3.834
cartazes de filmes
53.681
fotos de filmes e personalidades
6.323
telenovelas, reportagens para TV, longas, médias e curtas
24.364
textos, entre roteiros, artigos, manuscritos
PARCERIA COM O ITAÚ PLAY
Uuma das formas de melhorar o banco de conteúdos é buscar parceiros e desenvolver projetos especiais, diz a diretora técnica. Neste sentido, a entidade e o Itaú Play fecharam uma parceria para levar à plataforma obras do acervo da Cinemateca, também gratuitamente.
As 13 primeiros chegaram ao Itaú Play no final de abril, com produções do cinema mudo brasileiro, coloridos por diversas técnicas, recém-restaurados pela Cinemateca. Um dos destaques é ‘Brasa Dormida’ (1928), de Humberto Mauro, marco do cinema nacional.
“Este é um recorte sobre o cinema silencioso. Em breve, as obras entram no BCC. São conteúdos que apenas a Cinemateca pode oferecer”, afirma Gabriela.
Também já está disponível a série Veja Brasil, com documentários produzidos nos anos 1950 por Alceu Mayard Araújo, estudioso do folclore brasileiro. As obras, que foram exibidas na TV Tupi, também fazem parte do acervo da Cinemateca.
PROCESSO DE DIGITALIZAÇÃO
É difícil precisar, segundo a diretora técnica da Cinemateca, o tempo necessário para digitalizar um filmeo. “Cada obra é um caso específico, pois é preciso saber se ela está apta a ser digitalizada, tanto por questões técnicas quanto de direitos autorias”, diz. Por esta razão filmes da Vera Cruz e da Atlântida e de Glauber Rocha, por exemplo, já estão no BCC. A União detém os direitos das obras das duas produtoras e os direitos não comerciais dos longas do diretor.
Entre os fatores que são levados em conta são o estado do material e a disponibilidade do equipamento que faz a digitalização. “Primeiro, fazemos uma cópia bruta, depois a processamos para chegar a um arquivo com resolução mais baixa para o BCC”, diz Gabriela.
Um exemplo, afirma, é o processo de catalogação da coleção do Ince (Instituto Nacional do Cinema Educativo), uma das primeiras a entrar no BCC e que tem entre suas obras ‘A Velha a Fiar’ (1964). “Neste caso, não havia nem sinopse dos filmes e nenhuma literatura sobre eles. Agora, no BCC, eles são acompanhados de ficha técnica, de dados de contexto e identificação de personalidades. Isso só foi possível após a recuperação dos filmes em laboratório e a criação de uma cópia. Com ela, fomos atrás das informações, começando do zero”, afirma Archangelo.
ONDE VER
Banco de Conteúdos Digitais da Cinemateca
www.bcc.org.br
Itaú Play
https://www.itauculturalplay.com.br/