Ele nem se preocupou em disfarçar a compra de votos dos parlamentares
É dada como certa a reeleição de Arthur Lira (PP-AL) para mais dois anos na presidência da Câmara dos Deputados, contando com o apoio declarado de 20 partidos, num arco tão amplo quanto bizarro, que reúne do PT à extrema direita.
A vitória de Lira será um veneno para a reconstrução da normalidade institucional. Não se pode avaliar o estrago que Bolsonaro deixou no Brasil sem considerar a cumplicidade do chefe da gangue parlamentar vulgarmente conhecida como centrão. Lira jogou no lixo mais de 140 pedidos de impeachment de Bolsonaro e adotou como norma o silêncio conivente diante da pregação golpista do fugitivo, ora na Flórida. Por meio do orçamento secreto, operou engrenagem de corrupção jamais vista na Câmara e, com atraso, extinta pelo STF.
Ainda retém, contudo, poderes hipertrofiados e os exerce com despudor. Com DNA enraizado no mais reles fisiologismo, nem se preocupou em disfarçar a compra de votos de parlamentares. Foi o que se viu com o injustificado aumento de salário, benesses e mordomias para os deputados, generosidade com chapéu alheio (o nosso, no caso) que saberão retribuir na urna.
Ao sabor das barganhas e tocaias que sabe armar como poucos, Lira almeja ser um copresidente, mandando e desmandando na agenda de Lula. Atuará em terreno favorável: uma Câmara de baixa qualificação, com a banda podre da rapinagem anabolizada, a direita reacionária fortalecida e um campo governista instável e sujeito a uma boa dose de volatilidade.
Um Legislativo crítico e independente é saudável e necessário para uma democracia minimamente funcional. Mas não é isso o que Lira pode oferecer. Dele, o que se pode esperar é indigência institucional e degradação na relação entre os Poderes. Em boa hora, está de volta o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ), que lançou sua candidatura ao comando da Casa. Alencar não tem a menor chance. Mas não deixa de ser um alento saber que existe uma reserva de dignidade na Câmara.