Primeira Turma votou pela suspensão de artigo da Constituição fluminense que delega ao TJ a responsabilidade de julgar vereadores
O filho do presidente é alvo de uma investigação criminal que, em razão da regra atual, atualmente é conduzida pelo gabinete do procurador-geral de Justiça do Rio, Eduardo Gussem.
Por unanimidade, os cinco ministros da turma do Supremo entenderam estar suspenso artigo da Constituição do Rio de Janeiro que estende aos vereadores no estado a prerrogativa dos deputados estaduais de serem julgados por desembargadores, e não por um juiz de primeira instância.
O relator do caso no STF foi o ministro Alexandre de Moraes, cujo voto foi referendado pelos ministros Luiz Fux, Marco Aurélio Mello, Rosa Weber e Luís Roberto Barroso. O julgamento ocorreu no plenário virtual, no qual os ministros da turma podem se manifestar ao longo de uma semana após a apresentação do voto do relator. A sessão foi encerrada nesta sexta-feira.
O foro no qual Carlos é investigado é o mesmo que seu irmão, Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), busca levar a investigação sobre a “rachadinha” em seu antigo gabinete. Nesta quinta (18), Fabrício Queiroz, suposto operador do esquema, foi preso preventivamente por decisão do juiz Flávio Itabaiana, da primeira instância.
Carlos atualmente é investigado na esfera criminal sob suspeita de empregar funcionários fantasmas –suspeita que também recai sobre Flávio. A apuração é conduzida pelo Gaocrim (Grupo de Atribuição Originária Criminal), ligado à Procuradoria-Geral de Justiça. Eventuais medidas cautelares –como quebra de sigilo bancário– dependem de decisão de um desembargador. Há ainda uma investigação cível sobre o mesmo tema, sem foro especial.
Carlos e Flávio negam as suspeitas apuradas pelo MP-RJ.
Caso perca o foro na esfera criminal, como ocorreu com o irmão, a investigação de Carlos será conduzida por promotores e supervisionada por um juiz criminal de primeira instância.
Membros do MP-RJ avaliam que a apuração poder ganhar agilidade com este modelo, a depender do promotor designado.
O processo no qual Moraes considerou suspenso o artigo se refere a um ex-vereador de Mangaratiba. Ele pediu que seu caso fosse julgado por um juiz de primeira instância por ter renunciado ao mandato.
Ao analisar o caso, o ministro-relator aceitou o pedido, estendeu a decisão a outro acusado no processo, atualmente vereador, e defendeu que o artigo está suspenso em razão de decisão anterior do STF, apontando ser inconstitucional a criação de foro especial pela legislação estadual.
Apenas Rio de Janeiro, Piauí e Roraima concedem essa prerrogativa a vereadores.
No MP-RJ, a avaliação é que a decisão do caso será válida a todas as investigações em andamento que envolvem vereadores no estado, incluindo Carlos. A decisão sobre redistribuir os procedimentos ficará a cargo do procurador-geral de Justiça, Eduardo Gussem.
As investigações contra vereadores no Rio de Janeiro costumam encontrar dificuldades legais justamente pela insegurança jurídica do foro especial. Dos quatro grupos de Câmaras Criminais do TJ-RJ que analisam processos de pessoas com foro, dois têm maioria para entender que membros das Câmaras Municipais não têm essa prerrogativa.
Essa divergência ocorre porque há decisões do próprio tribunal que apontam a inconstitucionalidade da regra. O STJ (Superior Tribunal de Justiça), porém, já referendou o foro no passado. Já o STF tinha uma liminar considerando o dispositivo inconstitucional —entendimento agora referendado pela Primeira Turma.
Em alguns casos, os processos demoram a ser analisados em razão de uma longa discussão legal sobre qual o magistrado é competente para analisar o caso, atrasando as investigações.
O MP-RJ propôs em 1991 no STF uma ação direta de inconstitucionalidade questionando o foro de vereadores. O caso, sob relatoria de Cármen Lúcia, ainda não teve um julgamento final.
O presidente do Supremo, Dias Toffoli, apresentou uma proposta de Súmula Vinculante para abolir a instituição de foro especial por meio de constituições estaduais.
Carlos é alvo de investigações sigilosas para apurar a contratação de funcionários fantasmas. Na área cível, o vereador não tem foro especial.
Em abril de 2019, a Folha revelou que Carlos Bolsonaro empregou até janeiro daquele ano uma idosa que mora em Magé, município a 50 km do centro do Rio. Nadir Barbosa Goes, 70, negou que tenha trabalhado para o vereador. Ela recebia, como oficial de gabinete, uma remuneração de R$ 4.271 mensais.
Outra funcionária suspeita de ser fantasma revelada pela Folha é Cileide Barbosa Mendes, 43, espécie de faz-tudo da família Bolsonaro. Enquanto esteve lotada no gabinete de Carlos, ela apareceu como responsável pela abertura de três empresas nas quais utilizou como endereço o escritório do hoje presidente Jair Bolsonaro.
Na prática, porém, ela era apenas laranja de um tenente-coronel do Exército —ex-marido da segunda mulher de Bolsonaro— que não podia mantê-la registrada no nome dele como militar da ativa.
Após ter sido babá de um filho de Ana Cristina Valle (que foi companheira de Bolsonaro e é mãe também de Renan, filho dele), Cileide foi nomeada em janeiro de 2001 no gabinete de Carlos, que era vereador recém-eleito. Novato na política, Carlos tinha 18 anos na época.
Enquanto Carlos pode perder o foro especial, Flávio ainda briga para garanti-lo.
O TJ-RJ deve julgar na semana que vem um recurso do senador pedindo para que sua investigação seja acompanhada pelo Órgão Especial. Ele alega ter direito à prerrogativa pelo fato da apuração sobre a “rachadinha” tratar do período em que era deputado estadual.
Flávio é suspeito de recolher parte do salário de seus ex-assessores na Assembleia e lavar o dinheiro por meio de transações imobiliárias e sua loja de chocolates. Apontado como operador do esquema, o ex-assessor Flávio Bolsonaro foi preso nesta quinta-feira.