“Marcelo sente-se injustiçado. Ele se vê como um bode expiatório. Acha que pagará o preço mais alto entre todos os envolvidos na Lava Jato também porque seu pai aceitou delatá-lo”, afirmou ao UOL um funcionário de alto escalão da Odebrecht.
“Marcelo pagava mesmo propina e, de certa forma, desafiava as autoridades que poderiam o incriminar. Emílio, por sua vez, era mais conservador. Cometeu e sabia de ilegalidades, mas era mais contido”, acrescentou.
Na última sexta-feira (27), Marcelo Odebrecht ratificou a um juiz auxiliar do STF (Supremo Tribunal Federal) o depoimento feito a procuradores da operação e confirmou os termos de seu acordo de delação premiada.
Colaborar com os investigadores foi uma derrota pessoal de Marcelo e uma vitória de seu pai, além de abrir a crise de relacionamento entre os dois protagonistas do clã baiano de origem germânica. Nos primeiros meses após sua prisão –ocorrida em junho de 2015, durante a 14ª fase da operação–, o executivo insistia em negar as acusações e rejeitava aderir a um acordo. Emílio, por sua vez, decidiu rapidamente pela delação como forma de preservar a empresa.
Grupo de Emilio versus grupo de Marcelo
Na primeira visita que fez a Marcelo na prisão em Curitiba, em setembro de 2015, Emílio o sugeriu que optasse por delatar, hipótese repelida pelo filho, como revelou a revista “Piauí”. Marcelo está detido na carceragem da sede da Polícia Federal em Curitiba. “Em determinado momento, ele reclamou de que o pai não aparecia para visita-lo”, disse um investigador da Lava Jato.
“Este assunto [a delação] estremeceu a relação entre ambos. Havia dois grupos na empresa: o de Marcelo, que não queria a delação de jeito nenhum, e o de Emílio, que achava a delação a melhor saída”, disse um membro do Conselho de Administração da Odebrecht. “Venceu a tese de Emílio.”
A descoberta pela Polícia Federal do setor de “operações estruturadas”, responsável pela sistematização do pagamento de propinas, em março de 2016, e a crise financeira que atingiu o grupo aumentaram a pressão sobre Marcelo.
Emílio tomou a iniciativa de procurar um acordo com as autoridades. Em maio de 2016, a empresa firmou o termo de confidencialidade, o que deu início às negociações para as delações premiadas, que estão a um passo de serem homologadas pela presidente do STF, ministra Carmen Lúcia. Todos os 77 delatores ligados à empresa ratificaram seus depoimentos à Justiça até sexta-feira.
“Nunca foram exatamente alinhados”
“A referência de Marcelo sempre foi Norberto. Ele e o pai nunca foram muitos próximos. Eles têm personalidades diferentes. Emílio é extrovertido, Marcelo, o contrário”, afirmou uma pessoa de Salvador próxima à família, em referência ao patriarca Norberto Odebrecht (1920-2014).
“Emílio e Marcelo nunca foram exatamente alinhados. O filho sempre foi conhecido por seu estilo agressivo nos negócios e até na corrupção”, diz o funcionário da Odebrecht.
A título de exemplo, o ex-executivo Claudio Melo Filho disse, em sua delação premiada, que a Odebrecht passou a atuar com mais intensidade no pagamento de propinas a deputados e senadores para a aprovação de medidas provisórias após a chegada de Marcelo à presidência do grupo.
“A partir de 2009 e 2010, as MPs passaram a ter mais valor para a empresa, justamente por causa da saída de Pedro Novis e da entrada de Marcelo Odebrecht na diretoria da Odebrecht”, afirma Melo Filho em sua delação.
Conhecido no meio empresarial e político como “Príncipe”, Marcelo Odebrecht assumiu em dezembro de 2008 a presidência do conglomerado de empresas que leva o nome de sua família. Ele deixou o cargo em dezembro de 2015, seis meses depois de ser preso.
“Marcelo praticamente forçou Emílio a aceitar que ele assumisse a presidência quatro anos antes do que estava previsto. Marcelo queria mostrar ao pai que era capaz de comandar a empresa”, afirmou o membro do conselho da Odebrecht.
“Mãe deixou de visitar Marcelo na prisão”
O rompimento entre pai e o filho envolveu os integrantes da família Odebrecht.
“A coisa ficou tão feia que a mãe deixou de visitar Marcelo na prisão”, afirmou um outro investigador da Lava Jato.
“A mulher não foi às festas de fim de ano da família, como era tradição”, afirmou o funcionário da Odebrecht.
Grupo não terá membros da família Odebrecht entre os gestores
De acordo com o jornal “Folha de S. Paulo”, os advogados da Odebrecht e o MPF fecharam um acordo para que o herdeiro da construtora permaneça preso em regime fechado até dezembro de 2017. Após essa data, ele cumprirá o restante de sua pena de dez anos em regimes semiaberto e aberto. Ele não poderá trabalhar mais nas empresas de sua família.
Já Emílio Odebrecht permanecerá ainda dois anos à frente do conselho de administração da Odebrecht, como prevê seu acordo de delação premiada. Durante o intervalo ele comandará a transição de poder dentro do grupo, que não contará mais com membros da família Odebrecht entre os gestores. A família passará apenas a ser investidora e o grupo abrirá suas ações ao mercado — ideia que sempre teve a rejeição de Marcelo.
Após esses dois anos, Emílio passará a cumprir sua pena acordada com o Ministério Público Federal. Ele vai cumprir dois anos de prisão domiciliar em regime semiaberto. Neste período, ele precisará estar em casa das 22h às 6h e durante os finais de semana. Depois disso, Emílio cumprirá outros dois anos em um regime aberto domiciliar, no qual precisará a se recolher somente durante o fim de semana.
No último dia 1 de dezembro, a Odebrecht também divulgou um pedido de desculpas público e admitiu práticas impróprias. Procurada pela reportagem, o grupo empresarial afirmou, por meio de sua assessoria de imprensa, que não irá se manifestar sobre o assunto do rompimento entre Marcelo e Emilio.
UOL – Curitiba