Direita bancada com dinheiro público e dificuldade de pensamento

O encontro de direita comandado pelo deputado Eduardo Bolsonaro fechou com chave de ouro. O CPAC, sigla de Conservative Political Action Conference do original americano, teve bancados seus custos com R$ 1,1 milhão do fundo partidário do PSL. O alto volume de dinheiro público foi revelado pelo site O Antagonista. A previsão era de R$ 800 mil reais, mas o orçamento seguiu a linha de planejamento de gasto de obra pública, com aditivo bem alto. É claro que nos Estados Unidos o evento original não usa dinheiro público, mas a direita daqui usa método local, aliás de muita semelhança com o que faz a esquerda, que esteve recentemente no poder. A forma de lidar com o dinheiro do contribuinte é a mesma.

Além desta marca, digamos, conceitual como prática política, o CPAC brasileiro não trouxe nada de destaque na área do pensamento, até porque a impressão que ficou é que no plano internacional o evento teve dificuldade de contatar alguma estrela do pensamento conservador, o que talvez se deva a um fato importante que já apontei: ao contrário do que se falou durante o fim de semana, o evento não é conservador. É um evento de direita. E numa classificação política mais rigorosa, seu promotor Eduardo Bolsonaro nem pode ser definido politicamente dessa forma. Na verdade, o filho do Bolsonaro é de extrema-direita.

Esta confusão que vem sendo feita de modo deliberado pela direita brasileira e que a mídia vem engolindo pode acabar demolindo a credibilidade do pensamento conservador no Brasil. Para dar um exemplo internacional, basta observar como essa direita trata a chanceler alemã Angela Merkel, uma dirigente importante do conservadorismo no mundo. Para eles, essa mulher é uma liberal, sendo que alguns devem achar até que ela é comunista. O equívoco não vem apenas da dificuldade mental da conturbada psicologia dos bolsonaristas nem de seu absoluto desconhecimento até do que é mais básico em história e política. É só a comprovação de que de fato situam-se à direita do conservadorismo.

O evento do filho de Bolsonaro teve dificuldade de trazer estrelas do pensamento conservador pela mesma razão que fez Marine Le Pen refutar na hora a relação que tentaram fazer de sua imagem com a de Jair Bolsonaro, logo que ele foi eleito. Uma estrela da CPAC foi a ministra Damares Alves, digo só para vocês sentirem o nível de qualidade da coisa. Uns mais gaiatos dirão logo que cada evento tem a musa que merece, no que até que estão certos, além de que Damares como atração em qualquer rodinha de conversação facilita bastante para saber o nível intelectual dos presentes. E para provar que não estou errado, a outra estrela do espetáculo foi o inacreditável ministro Abraham Weintraub.

Mas não é que no final a ministra Damares foi quem melhor definiu o nível de qualidade desta CPAC brasileira? Pois é, ela fez isso dando aos jornalistas uma avaliação sobre o público presente aos trabalhos. Sabe-se que é mesmo pela avaliação da plateia que se pode fazer um bom exame de qualquer evento, de modo que serão notadas as diferenças entre fãs de show de rock heavy metal, de samba e claro que também de participantes de uma conferência política internacional.

Foi interessante o exemplo utilizado por Damares na sua explanação sobre a qualidade do público do evento de direita. A ministra usou bandalhices pornográficas da eleição passada para a comparação, que na visão dela qualifica a plateia da conferência. A fala da ministra está gravada em vídeo, que rola na internet. Fazendo cara de quem acaba de sacar uma tese muito brilhante, ela disse o seguinte: “Estou aqui há 24 horas e ninguém me ofereceu ainda um cigarro de maconha e nenhuma menina introduziu um crucifixo na vagina”. Ora, ainda que provavelmente sem querer, isso  foi mesmo um achado. A percepção de Damares sobre a qualidade das pessoas que compareceram ao CPAC mostra que o nível intelectual do público esteve à altura dos pensadores no palco.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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