Quando Paulo Guedes foi nomeado superministro da Economia do governo Bolsonaro, graças à fusão dos ministérios da Fazenda, do Planejamento e da Indústria e Comércio Exterior, muitos analistas destacaram que a economia brasileira estava entregue a uma corrente acadêmica das mais conservadoras do mundo. Guedes é pós-graduado pela Universidade de Chicago, que tem na entrada um busto do ultraliberal Milton Friedman.
Durante a sangrenta ditadura do general Augusto Pinochet, economistas chilenos formados por Friedman aplicaram um inflexível “programa de recuperação”, que privatizou mais de 400 empresas, esvaziando totalmente o setor público. Com os sindicatos reprimidos e forte repressão política, as áreas da saúde, educação e previdência também foram privatizadas. “São reformas inimagináveis em um contexto democrático”, na opinião do jornalista Manuel Delano, coautor do livro A Herança dos Chicago Boys, de 1989.
Quando fez a pós-graduação em Chicago, Paulo Guedes teve colegas chilenos que vieram a assumir postos chaves na ditadura Pinochet. A convite de um deles, Guedes trabalhou como pesquisador e acadêmico no Departamento de Economia da Universidade do Chile nos anos 80. Ele é apontado pelos próprios colegas chilenos como um temível Chicago Boy. “Recordo-o como um capo, embora assim como Bolsonaro seja aterrorizante”, disse ao jornal La Tercera Rolf Luders, que foi ministro da Fazenda e da Economia de Pinochet, entre 1982 e 1983.
Antes mesmo de assumir o superministério, Guedes convocou um grupo de Chicago Boys para auxiliá-lo na tarefa de repetir o desmonte do Estado que foi executado no Chile. Para o BNDES, convidou Joaquim Levy, que foi ministro da Fazenda no segundo governo Dilma Rousseff e se destacou ao sabotar tudo que foi feito por Guido Mantega. O Banco do Brasil foi entregue ao economista Rubem Novaes, com a missão específica de privatizar o banco oficial. E para a presidência da Petrobras, Guedes chamou Roberto Castello Branco, com longa trajetória no mercado financeiro e na Vale.
Como o mais novo era Joaquim Levy, com 57 anos, o economista Carlos Langoni, também PhD pela universidade americana, batizou o grupo de “Chicago Oldies”. O tempo passou, mas o pensamento econômico é mesmo. E o objetivo era esvaziar o BNDES e se desfazer das participações acionárias da BNDESpar (o que foi feito), privatizar o Banco do Brasil e vender ativos e refinarias da Petrobras, até chegar o momento de também entregar a exploração do petróleo ao setor privado.
Paulo Guedes só não contava com as idas e vindas de Jair Bolsonaro. O primeiro dos 4 de Chicago a cair foi Joaquim Levy. Pressionado por Bolsonaro para tornar públicas todas as operações do BNDES, Levy justificou que os grandes negócios envolviam sigilo comercial e, se divulgados, poderiam levar a processos na Justiça. Bolsonaro não aceitou as justificativas e demitiu Levy. A vaga foi ocupada por um amigo dos filhos do Capitão Corona.
Rubem Novaes durou mais tempo à frente do Banco do Brasil, mas também sofreu pressões para apressar o ritmo de privatização da instituição. Defendeu a venda do banco estatal, mas renunciou ao cargo em julho do ano passado, alegando que não se adaptou “à cultura de privilégios, compadre e corrupção de Brasília”. Afirmou também que havia muita gente com o rabo preso em Brasília. E por aí ficou, sem dar nome aos bois. A ideia de jerico de vender o BB caiu por terra. Não se falou mais nisso.
Finalmente, chegou a demissão de Roberto Castello Branco. Sua gestão pode ter agrado aos acionistas, mas foi demolidora para os interesses do país. Oito refinarias foram postas à venda a preço de banana. Segundo cálculos do Instituto Estratégico de Petróleo e Gás Natural (Ineep), a Refinaria Landulpho Alves, na Bahia, está sendo vendida pela metade do valor. Avaliada entre US$ 3 bilhões e US$ 4 bilhões, será entregue por U$$ 1,65 bilhão ao grupo Mubadala Capital, dos Emirados Árabes. Com as vendas de ativos, a Petrobras embeleza os balanços e distribui generosos dividendos. O mercado faz festa e agradece.
Mas o motivo da demissão de Castello Branco foi a política de preços dos combustíveis, que ele atrelou totalmente ao mercado internacional. Ou seja, fez o que manda a cartilha da Universidade de Chicago. Que funcionou muito bem no Chile, durante a ditadura. No Brasil de hoje, mesmo com o desgoverno de Jair Bolsonaro, não dá para se aplicar na íntegra o ultraliberalismo de Friedman. Apesar da choradeira do mercado, Castello Branco caiu do galho.
Agora só resta Paulo Guedes. Que insiste em cortar verbas da educação e da saúde, como foi feito pelos Chicago Boys no Chile. Pau que nasce torto morre torto!
Octavio Costa