
Mas a casa onde vivem anda em pé de guerra conjugal, para citar uma velha expressão do vampiro da Poláquia. A desdentada, mal-amada, teima que o marido tem amante. Não tinha, mas resolveu arranjar uma só de pirraça. Agora, a família do pintor não quer vê-lo nem pintado. É por isso que, nos domingos, diz pra mulher que tem serviço e vai com a outra passear no parque Tanguá. Erde!
A interjeição conhecida dos curitibanos – eufemismo para “merda”? – se repete no discurso do narrador. Sua voz é sempre crua, áspera e direta, como uma idéia que surge veloz no pensamento, mal dá tempo de refletir e pum, já está lá no papel, antecipada por um travessão:
– Agora, já não é a mesma coisa em casa. Tá fria comigo. Mais do que antes. Nem os pés das meias ela junta. Não enrola. Tudo espalhado na gaveta. De vinte pés não dá dois pares.
Os fragmentos vão se amarrando, ocupando quarto-cozinha-banheiro-área-de-serviço-garagem-fachada, como se o texto começasse na intimidade da casa e fosse expulsando o pintor pro lado de fora.
Classificado no prefácio de Caio Junqueira Maciel como uma espécie de “Machado de Assis baratinado tomando um porre de Dalton Trevisan”, Nem bobo nem nada é o décimo livro do escritor e publicitário curitibano, que em 1988 ganhou o Concurso Nacional de Contos do Paraná com a antologia “Máquina de escrever”. É o tipo de leitura de um fôlego só, que te pega pelas canelas, só desgrudando na última linha.
Mas, já vou avisando, de nada adianta procurar nas livrarias. Nem bobo nem nada está à venda exclusivamente pela internet. É só pedir pelo e-mail abaixo e esperar o carteiro chegar. Garanto que você não vai se arrepender.
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