O brasileiro já se habituou a ler ou ouvir frases como “o partido tal ganhou o ministério X”. Ou “a legenda de fulano levou a estatal Y”. São comentários tão frequentes que passam despercebidos. Mas experimente colocar a troca de uma medalhista olímpica por um zagueiro do centrão nas suas circunstâncias.
Pense na conversa em que Janja deve ter feito ponderações a Lula, na intimidade do Alvorada: “Quem sabe na Ana Moser a gente não mexe! Pode pegar mal junto às mulheres.” Lula deve ter toureado a primeira-dama com a mesma lábia que usou na live de terça-feira.
“É sempre muito difícil você chamar alguém para dizer que vai precisar de um ministério porque fiz acordo com partido político, mas essa é a política”, declarou Lula. Foi como se desejasse realçar, com outras palavras, uma expressão repetida desde a chegada das caravelas: “É normal!.”
Antes da escalação de Fufuca para a vaga de Ana Moser, o PP travou com o Planalto uma controvérsia sobre o peso da substituição em moedas. Muito ou pouco? Pouquíssimo, avaliou o partido, arrastando para a caixa registradora dos Esportes a coleta que virá da futura tributação dos games. Coisa de R$ 12 bilhões por ano.
Além do tributo, virão as emendas orçamentárias que os parlamentares do centrão planejam enfiar dentro das arcas do ministério. A conquista política se converte rapidamente em ganho financeiro. Conviria perguntar: O dinheiro será aplicado tendo em vista os benefícios eleitorais que pode render ao partido? Serão premiados os apaniguados? Deseja-se roubar?
Embora sejam incontornáveis, as indagações são apenas sussurradas. Nem os jornalistas se arriscam a perguntar em voz alta. Todos têm medo de parecer ingênuos. Nada é tratado como anormal, exceto a impressão de que “nada” já se tornou um vocábulo que ultrapassa “tudo”.
Alega-se à boca miúda que poderia ser pior, pois Arthur Lira chegou a pleitear a pasta da Saúde ou o ministério do Bolsa Família. Mas o apetite do condestável do centrão ainda não foi aplacado. O Planalto informa que Lula entregará a Caixa Econômica ao PP quando retornar da viagem à Índia. Falta definir quantas diretorias e vice-presidências do banco estatal Lira controlará além da presidência.
Piscam no letreiro nacional as mesmas perguntas de sempre, que não serão formuladas nem respondidas senão quando explodir o próximo escândalo: Que fará o PP com a Caixa? Oferecerá empréstimos com juros camaradas a cabos eleitorais? Franqueará convênios a prefeitos amigos candidatos à reeleição? Ou deseja apenas impor a filosofia do fisiologismo ao setor bancário?
Hoje, quando um oligarca partidário condiciona o apoio legislativo ao “espaço” que o governo for capaz de ceder à sua legenda, todos sabem decifrar o enigma. “Espaço” é apenas um outro nome para a extensão ideal, de preferência ilimitada, para que os partidos estruturem dentro dos cofres públicos suas redes de falcatruas e achaques.
Protagonista do petrolão, o PP de Lira tem um enorme passado pela frente. Sobretudo depois que Dias Toffoli gastou a tinta de sua caneta suprema para anotar que são imprestáveis todas as provas obtidas no acordo de leniência da Odebrecht.
Em antigas gestões petistas, as legendas do centrão eram a favor de tudo ou contra qualquer outra coisa, desde que fossem assegurados seus “espaços” na máquina pública.
Sob Bolsonaro, os filhos gentis do centrão se renderam ao patriotismo de resultados. Num brado retumbante, esclareceram que suas vísceras jamais voltariam a ser vermelhas. Chegam ao primeiro 7 de Setembro de Lula 3 sussurrando “independência ou morte”.
Longe dos raios fúlgidos, o centrão troca o intestino verde-amarelo por qualquer “espaço” furta-cor. No Ministério dos Esportes, saiu Ana Moser, para a entrada de um Projeto Fufuca de Poder. Experimente pensar só nisso. Esqueça qualquer outra coisa.