Quem viu o filme “O Segredo dos Seus Olhos” sabe de quem eu estou falando. O filme é bom, mas nada no filme é melhor do que ela, no papel de uma juíza por quem o protagonista principal tem uma paixão recolhida, e poucas vezes na história do cinema foi tão fácil entender uma paixão. Soledad é fantástica dos cabelos às presumíveis pontas dos pés, passando por olhos verdes, uma boca ao mesmo tempo sardônica e sensual e um corpo que a sobriedade magistrática tenta disfarçar em vão – e tudo projetando a sensibilidade e a sabedoria que se espera da justiça humana.
A Argentina tem nos mandado um bom filme depois do outro, ultimamente, e grande parte da sua atração se deve ao estilo naturalista de representar dos seus atores. “O Segredo dos Seus Olhos” – que tem algumas falhas de lógica e verossimilhança que não atrapalham a bela trama – é um admirável exemplo disto. O elenco todo é extraordinário. Mas a principal razão para ver e rever o filme é a Soledad.
Desconhecimento.
Eu nunca tinha ouvido falar nela. Agora sei que tem 41 anos e já fez vários outros filmes, peças de teatro e séries para a TV na Argentina – e há pouco fui vê-la no palco como cantora. Levado, acima de tudo, pela necessidade de saber se ela era de verdade. E descobri que Soledad não apenas existe como é uma ótima interprete de tangos e milongas e da música folclórica do seu país, com uma presença de palco que não deveria surpreender quem já a viu dominando um filme inteiro. Uma frustração apenas: ela se apresenta com um vestido longo até o chão, o que nos impediu de avaliar corretamente o corpo apenas adivinhado por baixo dos tailleurs judiciais, no filme. Mas pelo pouco que deu para ver, ele também é perfeito.
O perigo, depois do sucesso do filme, que venceu o Oscar de melhor estrangeiro, é levarem a Soledad embora, e da próxima vez que a virmos ela ser uma coadjuvante mexicana num filme de Hollywood.
Proponho que se comece uma campanha preventiva, “Fica, Soledad”, para impedir que isto aconteça. Fique na Argentina, Soledad. Ou venha para o Brasil. Lá em casa tem lugar.
Luis Fernando Verissimo, em algum lugar do passado.