RIO DE JANEIRO – De janeiro a agosto deste ano, quase 2 milhões de famílias brasileiras deixaram de comprar maionese, condicionador de cabelo, TV de LED, passagem aérea para Aracaju e carro zero, em comparação com de janeiro a agosto do ano passado. Deixaram também de ir ao shopping aos domingos, fazer compras em dez vezes no cartão e jantar fora. E abandonaram os projetos do plano de saúde, da ida à Disney com as crianças e da casa própria com churrasqueira no quintal. Eram sonhos de 2014 para 2015. Infelizmente, esqueceram de combinar com 2015.
Com essa defecção em massa, imagine o rombo nas contas do varejo, dos serviços, da indústria, do sistema financeiro, das companhias aéreas, da construção civil e de todos os setores da economia. Diante da crise, a primeira medida das empresas é demitir, com os consequentes desemprego, fechamento de vagas, queda no salário real e estrangulamento do crédito. Não admira que as firmas de consultoria especializadas em avaliar para onde vai o Brasil, responsáveis por tais informações, estejam apontando o caminho do brejo.
Segundo as mesmas firmas, tudo indica que boa parte dos 3 milhões de famílias graduadas das classes D e E para a classe C no boom de consumo promovido pelo governo de 2006 a 2012 fará celeremente o caminho de volta para as ditas classes. É cruel porque, para aquelas famílias, a ascensão social terá sido uma ilusão. No que sentiram o prazer de subir um degrau na escada, esta lhes está sendo tirada, sem apelação.
Em compensação, não se notarão quedas expressivas nos números da indústria pesada, da educação, da saúde, do aprimoramento dos serviços ou dos índices de produtividade -porque, enquanto o país consumia feito um novo-rico, a base econômica não era muito levada em conta.
Nunca na história desse país se vendeu tanto uma miragem.
Ruy Castro – Folha de São Paulo