Quanto à liberação do porte de arma, dados do relatório mostram que a aplicação do Estatuto do Desarmamento deu uma segurada nos homicídios provocados por armas de fogo. Entre 1980 e 2016 cerca de 910 mil pessoas foram mortas dessa forma. No começo da década de 1980 a proporção de mortes a tiros era cerca de 40 para 100 pessoas assassinadas. O índice cresceu sem parar, atingindo 71,1% em 2003, ano em que foi sancionada a lei restringindo a venda de armas. A partir daí, o número permaneceu estável até 2016.
Outra constatação do relatório do Fórum Brasileiro de Segurança Pública que vai contra a liberação é que o maior crescimento de homicídios ocorreu exatamente em estados em que houve proporcionalmente um aumento maior de mortes por arma de fogo. O relatório aponta que se não fosse o Estatuto do Desarmamento o total de homicídios em todo o país teria crescido 12% além do observado.
Claro que os grupos favoráveis à liberação não se valem da lógica, muito menos da avaliação responsável de estudos e estatísticas sobre o assunto. A ideia de que uma arma na mão pode assegurar a defesa numa situação de violência não resiste a um raciocínio técnico sobre a questão. Nenhum especialista em segurança desvinculado de interesse financeiro ou político no tema apoiaria a crença de que a facilidade na compra de armas traria mais segurança coletiva, ainda mais em um país como o Brasil, onde o respeito moral e regras equilibradas de convivência sofreram uma tremenda implosão.
A proposta é ainda mais absurda quando vem apoiada na argumentação estapafúrdia do candidato Bolsonaro, com sua amadorística projeção de um aumento da segurança baseado no equilíbrio de forças entre bandidos e uma população mais armada. A imagem de três ou quatro bandidos sendo rechaçados a tiros por um pacato casal só cabe na cabeça de um fanático bolsonarista. O sonho de Bolsonaro parece ser o de um país com trilha sonora de Ennio Morricone e duelos ao entardecer, até porque ele parece não ter outra ideia de segurança que não seja a liberação de armas.
Sei muito bem que o assunto rende demais eleitoralmente para que passe a ser visto de forma lógica por políticos que há bastante tempo exploram sem escrúpulos o horror que toma da vida dos brasileiros. Já tivemos no poder o partido da raiva e agora aí estão os exploradores do medo buscando este mesmo poder. Esse pessoal vai manter o mesmo tom emocional, nesta proposta irracional de que a população assegure sua defesa com armas na mão. Eles vão tentar desqualificar de qualquer jeito este relatório, mas a verdade é que aí estão números sólidos demonstrando que as mortes só vão aumentar se for colocada em prática esta política do trabuco.