A pergunta veio como um sussurro, ou um pensamento que vem à tona: “será que alguém consegue viver sem isso?”. Referia-se ao barulho das ondas do mar, que se ouvia não muito longe. Pensei um pouco sobre a ideia, e logo percebi que a maior parte da minha vida não escutei esse som, que era tão próximo e fundamental para mim. O som que me fazia dormir, que me fazia sonhar, que me fazia sentir além-mar. Lembrei que o escutava quando criança, quando passeava com minha avó na praia antes do sol nascer. Me chamava a atenção a enorme quantidade de águas-vivas que a maré trazia de madrugada. Não sabia e até hoje não sei por que elas morriam na areia todas as manhãs.
O vento parecia ter combinado com o mar a batida das ondas, vinha e recuava, como se esperasse por aquilo todos dos dias. Uma vez contei quanto tempo levava para uma onda levantar e cair sobre as pedras. Sete segundos. O tempo que demora um silêncio compartilhado, o tempo que traz a espuma dos dias, o tempo que alivia uma dor que ainda não existe.
O som do mar ainda estará lá, infinitamente, com toda a aspereza do que é eterno, do que é indizível, do que ainda não se sabe, da esperança – palavra maldita – que existe uma espécie de futuro, de hemisfério, de linguagem ainda não inventada, de saber o que já se habita. Ouço mais atentamente esse som, porque a pergunta foi feita, porque antes não estava aqui.