Invernidades

Nada de se queixar de frio no trabalho. Lá fora faz a mesma temperatura para os desempregados.

No inverno, chegar é meio caminho para aconchegar.

Frio de 5º. O mínimo que se pode fazer pelos termômetros é pôr cachecol no pescoço deles.

No rigor deste inverno, a vingança é um prato de sopa que se toma tépido.

No tempo em que Deus dava o frio conforme o cobertor, o desamparo social não dava esse povaréu todo nas ruas. 

Ao ver a luz gelada no ar, o rigoroso inverno ficou tão excitado que teve uma estalagmite.

A temperatura baixou tanto no sul que já foram vistos vários carros circulando com suas calotas polares. 

No frio do sul, a cobertura jornalística procura os sem-teto, quando o que esses querem é ser procurados por cobertores.

No inverno, a sensação térmica castiga a todos, mais ainda quem tem o salário congelado. 

A campanha do agasalho funciona mesmo: a gente não vê publicitário passando frio.

Nas noites de inverno, dorme-se com esse verão portátil – o split. 

Para os corruptos e fraudulentos, Deus dá o frio conforme o acobertador.

Por mais dura que seja a realidade invernal, de noite ela ainda serve de colchão sob as marquises. 

No inverno, praia de nudismo é uma pouca vergonha: todos chegam agasalhados.

Comércio reabre e deve haver duas liquidações de inverno: nas lojas e nos hospitais. 

Um cafezinho tem o seu valor no inverno. E as cafeterias já estão explorando o consumidor.

No inverno, se acentuam os altos e baixos sociais: para uns, Aspen, Bariloche, Saint Moritz; para outros, submundos e subterrâneos. 

Em certos dias de inverno nos pampas os termômetros tomam sorvete de mercúrio.

No Pólo Norte, às vezes a temperatura cai tanto que chega ao Pólo Sul.

Como diria um gaúcho com chimarrão: a temperatura é de água quente de chaleira mas a sensação é de garrafa térmica.

A geada é o orvalho sem delicadeza alguma. 

No inverno, tem gente que sonha em vão: em vão de marquises, em vão entre prédios, em vão de viadutos.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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