Os depoimentos tornados públicos pelo ministro Alexandre de Moraes nesta sexta-feira, relacionados à investigação sobre a tentativa de golpe de estado em 2022, agravam a situação do presidente Jair Bolsonaro. Há semanas sabe-se que Bolsonaro dificilmente não será condenado e preso por crimes contra o estado democrático de direito. A novidade é que Bolsonaro aparece como líder da organização e trabalhando ativamente pelo golpe.
O essencial está nos depoimentos do ex-comandante do Exército general Marco Antonio Freire Gomes e do ex-comandante da Aeronáutica, brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Júnior.
Até suas falas, a PF podia provar que Bolsonaro havia feito reuniões, nas quais falava em fazer algo contra o resultado da eleição, e que havia u documento conhecido como minuta do golpe, que daria um pretenso embasamento jurídico para a decretação de uma operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) para melar a eleição.
Os depoimentos de Freire Gomes e Baptista Júnior agravam a situação por avançar em detalhes e colocar Bolsonaro como um operador ativo do golpe. As articulações começam depois da eleição, quando a tentativa de anular o pleito com uma comissão militar de fiscalização naufraga. A partir do final de novembro, a um mês de deixar o cargo, Bolsonaro acelera os planos.
Os ex-comandantes afirmam que foram convocados e participaram de reuniões em dezembro, no Palácio da Alvorada, nas quais Bolsonaro discutia a minuta do golpe. Fazia isso na presença do ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, Freire Gomes e Baptista Júnior e o comandante da Marinha, almirante Almir Garnier Santos. Entre um encontro e outro, Freire Gomes em especial era atualizado de modificações no texto por Mauro Cid, que havia sido seu subordinado anos antes.
Os dois confirmaram à PF que a minuta do golpe que Bolsonaro lhes apresentava era uma cópia da que foi encontrada na casa do ex-ministro Anderson Torres.
Já era conhecido que Freire Gomes e Baptista Júnior tinham se colocado contra o golpe. A novidade é que disseram isso a Bolsonaro mais de uma vez. Em uma das reuniões, mais perto da transmissão do cargo para Lula, diante da insistência do presidente, Freire Gomes advertiu Bolsonaro que o prenderia se tentasse o golpe. A história é contada também por Baptista Júnior.
Há uma diferença considerável entre o que a PF tinha antes e o que tem agora. Até os depoimentos, a polícia sabia tudo que Bolsonaro havia feito, mas não tinha suas ações.
Agora, pode dizer que a iniciativa para o golpe sempre partia de Bolsonaro. Toda a articulação em torno da minuta do golpe vinha pronta, do núcleo mais próximo do então presidente, que envolvia assessores como Felipe Martins e Tércio Arnaud, e os ex-generais Augusto Heleno e Braga Netto. Fica provado também que Bolsonaro trabalhou no texto da minuta do golpe, o que sempre negou – dizia ser um documento sem importância.
Fica claro que Freire Gomes, Baptista Júnior e Garnier eram convocados por Bolsonaro em busca de apoio ao golpe, como operadores da parte prática.
Observada de forma cronológica, a partir dos depoimentos que o ministro Alexandre de Moraes liberou, aprende-se que Bolsonaro jamais pensou em aceitar o resultado eleitoral de forma democrática. Tentou sabotar o processo com fake news sobre as urnas eletrônicas, depois fez uma pressão sobre o TSE com uma comissão militar e, diante de resultados negativos, passou a articular um golpe de estado.