Até que ponto é possível sonhar a mudança? Será que estamos condenados a repetir indefinidamente os mesmos ritos incompreensíveis, a viver uma sucessão interminável de casamentos e funerais que, vistos sem ilusões, não significam nada? Por que continuar? Para que continuar? Essas são questões que a peça KRUM, do dramaturgo israelense Hanoch Levin (1943-1999), encenada pela primeira vez no Brasil pela companhia brasileira de teatro, de Curitiba, sob a direção de Marcio Abreu, traz para o palco. A montagem estreou em março de 2015, no Rio de Janeiro e circulou por Belo Horizonte, São Paulo, São José do Rio Preto, Salvador, Porto Alegre e agora, finalmente, chega a Curitiba, no Teatro Guairinha. Serão apenas dez apresentações, de 11 a 21 de maio, de quinta, sexta e domingo, às 20h e aos sábados duas sessões: às 18h e 21h/ com preços populares, R$30 e R$15. A montagem consolida a parceria da companhia brasileira de teatro com a atriz Renata Sorrah.
KRUM é uma peça com dois enterros e dois casamentos. Não existem grandes feitos, tudo é ordinário. Entre as duas cerimônias, acontece uma sequência de cenas curtas, o quadro da vida dos habitantes de um bairro remoto. “É uma peça sobre pessoas. O que está em jogo é a matéria humana. Habitam o mundo de Krum seres pequenos, sem pudor na palavra, vivendo sob um teto baixo. Há um olhar, ao mesmo tempo, cruel e generoso sobre vidas mínimas ou, como em Tchekhov, sobre o que existe de mínimo no ser humano”, sublinha Marcio.
A peça tem início com o retorno ao lar do personagem-título, que, depois de perambular pela Europa em busca de experiências e quiçá de aprendizado, volta para casa – na periferia de uma cidade– de mãos vazias. Ao chegar, Krum confessa que não viu nada, não viveu nada, que nem mesmo no estrangeiro foi capaz de encontrar o que buscava.
Ao recusar a possibilidade de qualquer transformação existencial e de qualquer escapatória de um mundo onde o céu parece sempre tão baixo, o ar tão pesado e as estruturas sociais tão opressoras, Krum questiona a existência e a partir de tais questionamentos a peça apresenta o reencontro do recém-chegado com os curiosos habitantes de seu mundo: sua mãe, seus amigos, a antiga namorada e os vizinhos. Breves episódios de suas vidas desenrolam-se diante dos espectadores, que são instados a se identificar com a perspectiva distanciada e irônica de Krum. “O fim está no começo e, no entanto, continua-se”, as palavras de Beckett descrevem com perfeição o princípio estrutural de Krum.
A companhia brasileira de teatro e Renata Sorrah
A estreia do autor israelense no Brasil é o segundo projeto produzido a partir da bem-sucedida parceria entre a atriz Renata Sorrah e da companhia brasileira de teatro. A primeira foi Esta Criança, do autor francês Joël Pommerat, imenso sucesso de público e crítica que estreou no Rio de Janeiro, no fim de 2012 e, ainda hoje, viaja pelas principais cidades do país. Em mais de 40 anos de carreira, impactantes atuações em espetáculos, no cinema e na televisão fizeram de Renata, indiscutivelmente, um dos grandes nomes do teatro brasileiro. Ao lado dela, neste projeto, está a premiada companhia brasileira de teatro, fundada há 17 anos, em Curitiba, pelo ator, dramaturgo e diretor Marcio Abreu. A companhia é considerada pela crítica especializada como uma das mais consistentes do país, responsável por montagens marcantes para a história recente da dramaturgia e da encenação teatral brasileira. Curiosamente, Renata e a CBT têm em comum, entre outras investigações artísticas, a descoberta de dramaturgos contemporâneos, inéditos no Brasil, como o siberiano Ivan Viripaev (Oxigênio) e Jean-Luc Lagarce, com Apenas o fim do Mundo, espetáculos dirigidos por Abreu, e os autores Botho Strauss (Grande e Pequeno, 1985) e o norueguês Jon Fosse (Um dia, no verão, 2007), trazidos em espetáculos produzidos por Renata Sorrah – que também atuou nas antológicas montagens do alemão Rainer Werner Fassbinder (Afinal…Uma Mulher de Negócios, 1977; As Lágrimas Amargas de Petra Von Kant, 1982).
Atuam em Krum outros nomes de destaque na cena teatral contemporânea: Grace Passô, Inez Vianna, Cris Larin, Danilo Grangheia e Rodrigo Andreolli (stand by). Edson Rocha, Ranieri Gonzalez, Rodrigo Bolzan e Rodrigo Ferrarini – integrantes e colaboradores da companhia brasileira de teatro também compõem o elenco. A equipe de criação conta ainda com Giovana Soar (tradução), Nadja Naira (iluminação e assistência de direção), Fernando Marés (cenografia) e Felipe Storino (trilha e efeitos sonoros).
Sobre o Texto
Krum foi traduzido para o português diretamente do hebraico especialmente para esta montagem. Com humor ácido e lirismo pungente, fala sobre o fracasso e a precariedade de vidas mínimas, voltadas para os pequenos desejos forçados pela sociedade de consumo. Escrito em 1975 por Levin, na época um jovem autor influenciado por Tchekhov e Beckett, em um país mergulhado em conflitos e contradições. Durante seu período de vida, de 1943 a 1999, o autor testemunhou sete guerras. Estas vivências deixaram marcas evidentes em seus trabalhos. “Há em Tchekhov do entretempo, Beckett do pós-guerra, Levin do final do séc. XX e nós hoje, algo em comum. Enquanto o mundo turbulento destila suas violências, as pessoas tentam seguir suas vidas, muitas vezes, sem brilho, confinadas em suas casas ou alimentando expectativas, sonhos de consumo, esperança de dias melhores”, analisa Marcio Abreu.
Ao reler em chave política a dialética entre a vulgaridade e o lirismo, esta aparece como uma dialética entre o conformismo e a necessidade de mudança. Sublinhar o lirismo é, em larga medida, afirmar o inconformismo, o poder utópico de o teatro não apenas quebrar a quarta parede de que falava Brecht, mas de quebrar também as outras três paredes que o separam da vida social. Assim, o fato de a companhia brasileira de teatro ter decidido montar a peça de um autor israelense como Hanoch Levin em um momento histórico como o nosso, de acirramento do conflito Israel-Palestina e da explosão dos mais diversos fanatismos, é por si só significativo. Se, como diz o próprio Krum a certa altura da peça, “para algumas pessoas a palavra impossível não é uma brincadeira”, para outras, como os artistas envolvidos nesta produção, o mais importante é ser realista, é demandar o impossível.
Patrocínio: COPEL|Projeto realizado com o apoio do Programa Estadual de Fomento e Incentivo à Cultura/PROFICE – Secretaria de Estado da Cultura – Governo do Estado do Paraná.
SERVIÇO:
O que: Peça Teatral KRUM
11 a 21 de maio (de quinta a domingo)
Que horas: 20h (5ª, 6ª e dom) e às 18h e 21h aos sábados
Onde: Teatro Guairinha – Auditório Salvador de Ferrante
Endereço: Rua XV de Novembro, 971 – Centro
Bilheteria: Quarta a domingo das 14h às 18h
Informações: (41) 3315 0808
Ingressos: R$30 / R$15,00 (meia)
Descontos: 50% Gazeta do Povo e demais beneficiados com documentos.
Classificação etária: 16 anos
Gênero: Drama
Duração: 110 minutos
FICHA TÉCNICA
Texto: Hanoch Levin
Direção: Marcio Abreu
Elenco:
Cris Larin
Danilo Grangheia
Edson Rocha
Grace Passô
Inez Viana
Ranieri Gonzalez
Renata Sorrah
Rodrigo Ferrarini
Rodrigo Bolzan / Rodrigo Andreolli (em alternância)
Tradução: Giovana Soar
Adaptação: Marcio Abreu e Nadja Naira
Assistência de Direção e iluminação: Nadja Naira
Cenário: Fernando Marés
Trilha e Efeitos Sonoros: Felipe Storino
Figurino: Ticiana Passos
Direção de Movimento: Marcia Rubin
Direção de Produção: Giovana Soar
Produção Executiva: Cássia Damasceno
Assistente de Produção: Elisa Ribeiro
Assistente Administrativo: Helen Kaliski
Programação Visual: Fábio Arruda e Rodrigo Bleque – Cubículo
Fotos: Nana Moraes e Marcelo Almeida
Assistência de Cenografia e Direção de Cena: Eloy Machado
Produção e Realização: Renata Sorrah Produções Artísticas e companhia brasileira de teatro.