Uma ameaça ronda a Lava Jato. Ela não vem dos suspeitos de sempre, que são os políticos de Brasília, mas do próprio STF. A corte iria rediscutir na semana que vem, agora com efeito vinculante, se a decisão que tomou em fevereiro de permitir que réus sejam presos a partir de uma condenação em segunda instância continuará a valer.
O zunzunzum é o de que alguns ministros que votaram pela alteração poderiam mudar de ideia, o que faria com que voltasse a valer a regra de que a prisão só começa após o trânsito em julgado, isto é, até que não haja mais a possibilidade de recurso.
O prejuízo mais visível de uma eventual reversão da jurisprudência é para a Lava Jato. A possibilidade de ser preso logo após a condenação pelo TRF (e não mais pelo STF), ao estreitar os limites temporais da escala das décadas para a de um par de anos, deu enorme impulso às delações premiadas. Sem essa perspectiva de desfecho rápido, aumenta a tentação dos envolvidos de manter a boca fechada.
No que diz respeito ao mérito da questão, não me parece que a execução da pena após a segunda instância represente a dissolução do Estado de Direito como alguns advogados tentam pintar. Condenações injustas sempre ocorrerão, pois nenhum sistema é perfeito. E nem sequer sabemos se as instâncias superiores “acertam” mais ou menos que as inferiores, pois não temos acesso direto ao que aconteceu na cena do crime.
A decisão do STF é positiva porque introduziu um pouco de raciocínio logístico na Justiça. Para ser viável, o sistema precisa resolver a maioria dos casos em suas engrenagens iniciais. Não é uma coincidência que a maioria das democracias maduras adote o segundo grau como padrão. Não o fazem porque desprezem a segurança jurídica, mas porque uma hora o jogo precisa ser para valer. Caso contrário, deveríamos criar o quinto e o sexto graus e assim até o infinito.
Hélio Schwartsman – Folha de São Paulo