© Lacaio Wagner
Na situação em que ficou a presidente Dilma Rousseff com a retirada do PMDB de seu governo, vem a tentacão de escrever que ela está na “bacia das almas”. A expressão já vem sendo usada desde o início do ano, quando revelou-se a realidade que nós, os chamados “catastrofistas”, dizíamos que o PT acobertava desonestamente. Mas creio que é inapropriado o uso dessa expressão somente agora. Este ciclo de governos faz política na bacia das almas desde o começo da sua formação, já no primeiro mandato de Lula, que deu início a este ciclo desastroso de governos, que estava indo para quatro mandatos consecutivos, mas parece ter os dias contados até o corte abrupto de um impeachment.
A expressão “bacia das almas” é sobre a dificuldade de vender algo e costuma ser usada quando existe a obrigatoriedade dessa venda ser feita em qualquer condição, inclusive com o preço abaixo do que se obteria em uma condição normal. No caso de Dilma, ela terá mesmo que oferecer benefícios extras para que aceitem fazer negócios com ela. Acho mais acertada a expressão no sentido do uso de um recurso final, que vem após outras oportunidades já terem sido usadas ou menosprezadas. Dilma fez tanto uma coisa quanto outra, de vários jeitos. De qualquer forma, a expressão tem sempre o sentido de uma ação desesperada depois de perdidas todas as opções. Para se ter uma ideia do problema, a expressão, que é de origem católica, tinha no período medieval uma relação com angariação de dinheiro para missas em favor das almas do purgatório.
E foi na bacia das almas o batismo desse governo, ainda com Lula, em seu primeiro mandato. Nos acordos da primeira eleição de Lula, em 2002, entrou dinheiro para o convencimento da formação da chapa com o Partido Liberal (o PP de hoje), que entrou com o senador José Alencar como vice do petista. A primeira vitória teve que ser construída com a montagem de um quadro eleitoral que facilitasse a campanha do PT. Para isso tanto precisavam do PL de Alencar como era necessário também evitar sua aliança com o PSDB. E precisavam do vice senão teriam de sair com chapa pura. Na hora do acerto, Lula ainda falou para Alencar: “Vamos sair porque esta conversa é entre partidos, não entre candidatos”. Os dois candidatos ficaram na sala e os demais políticos foram para um quarto do apartamento falar de dinheiro. O partido de José Alencar já estava para lançar uma nota dizendo que a coligação PT-PL não ia sair, quando José Alencar falara com Lula, fazendo a ponte para o acerto. Por isso, Lula estava em Brasília para resolver o assunto.
O depoimento de Costa Neto sobre o acordo é um demonstrativo claro do batismo na bacia das almas desse ciclo desastroso do governo do PT: “O Lula e o Alencar ficaram na sala e fomos para o quarto eu, o Delúbio e o Dirceu. Eu comecei pedindo R$ 20 milhões, para levar uns R$ 15 milhões. Daí, ficou aquela discussão. Uma hora, o Zé Alencar entrou e falou: ‘E aí, já resolveram?’ Eles achavam que iam arrecadar R$ 40 milhões. Eu falei: ‘Tira R$ 15 milhões para a gente. É justo’. Eles ameaçaram ir embora. O Lula mandou ligar para o Patrus Ananias e avisou que, se a conversa não desse certo, ele seria o candidato a vice na chapa. Uma hora, o Dirceu chegou a dizer ‘acabou’. Eles batiam tanto o pé comigo que eu pensei: ‘Ô povo firme. Esses vão me pagar rigorosamente em dia’. Daí chamei o Zé Dirceu de volta para o quarto. O Zé Alencar veio junto. Falei: ‘Vamos acertar os R$ 10 milhões’. Voltamos para a sala e avisamos: ‘Está fechado’. Lembro ainda que o Zé Alencar falou “peça tudo por dentro”.
Assim, o que começou torto e jamais se endireitou, vai acabar do mesmo jeito. A situação desesperadora de Dilma completa o ciclo desse governo, que começou e se finda na bacia das almas. Porém, acho difícil que eles se livrem de um destino infernal.