Cinquenta anos? Nem parece! Ouvi esse tipo de comentário aos 30, aos 40 e agora aos 50. Com toda a sinceridade, sempre gostei. Sempre imaginei que aos 50 anos estaria aposentada da vida, como talvez tenha sido com a maioria das pessoas de gerações antes da minha. Eu também achava que aos 50 anos estaria velha, me sentiria velha, pareceria velha. A velha que não envelheceu diferente daquela que vive no imaginário coletivo, aquela que chega aos 50 e parece exatamente o que se esperava dela: velha.
É isso o que as pessoas pensam quando dizem “nem parece” ou “você está ótima”, pior, “tá enxutona”. Nem parece velha. Mas eu não sou a visionária que sempre soube que, como tudo na vida, envelhecer também não seria mais a mesma coisa. Só percebi isso na minha vez. Só me indignei quando entendi que não faz o menor sentido me envaidecer porque derrubei a expectativa alheia de parecer velha quando essa era a ordem natural das coisas. Estudar, casar, sofrer, ser feliz, sofrer mais um pouquinho, ficar velha e morrer. A ordem natural das coisas já foi esculhambada quando a expetativa de vida aumentou, quando a primeira velha resolveu desafiar as regras e se recusou a cortar o cabelo, a aumentar o comprimento da saia, a trocar a corrida pela tranca e a renunciar à sua vida por causa da família, do marido ou simplesmente porque ela se deixou convencer de que estava velha.
Nunca menti a idade. Mas não havia nada de revolucionário, não era uma bandeira contra o etarismo antes mesmo de se falar sobre o assunto Era pura vaidade, era soberba, era porque eu certamente me achava o último biscoito do pacote, a balzaca com cara de novinha, a coroa com jeito de moleca, a velha com colágeno dando pinta e botox na medida. Era gostoso pensar que a boa genética tinha vencido, quando havia um movimento muito maior, do qual eu já fazia parte, mas não tinha sensibilidade para perceber por que eu também era cheia de preconceitos sobre a relação da idade com a velhice.
Estava errada quando, aos 35 anos, tive um orgasmo mental porque um ex disse que eu parecia uma menina de 20. Eu não era uma menina, era uma mulher, que inclusive pagava a maioria da contas de casa, tinha uma carreira mais estável do que a dele, mas achei um baita elogio ele me colocar nessa posição de menina. Me ver naquele lugar de desamparo, de inexperiência, de frescor, talvez me fizesse acreditar que ele poderia me proporcionar, além de orgasmos, a proteção que eu nem precisava, mas que o fazia se sentir importante na relação.
Não me preparei para chegar aos 50. Minha vida ainda é muito parecida com a que eu tinha aos 30, resguardadas as limitações. É aquela coisa, quer passar a noite à base de drogas e rock’n’roll? Quero, mas sei que serão três dias para voltar a respirar sem a ajuda de aparelhos. Quer viajar de mochila pelo mundo? Vai, mas esquece os albergueres e gasta com um hotel decente. Quer manter o peso de 10 anos atrás? Saiba que só de olhar, a coxinha engorda. Mas eu tenho me rendido à coxinha.
Ainda me assusto quando digo minha idade em voz alta. Mais pela carga negativa que os 50 anos carregam do que pela relação que tenho com o fato. Eu sei a história que construí, tenho um apego enorme a todos os acertos e também aos erros, que tanto me ensinaram. Tem sido divertido demais para fazer de conta que não vivi tanto, que o tempo não passou, que não habito esse universo há décadas. Pretendo me demorar por aqui, sem aposentar meus hábitos, sem mudar meus gostos, sem encurtar meus caminhos.
Só envelhece quem está vivo, mas ficar velho é sinônimo de fim de linha aos olhos de quem é mais jovem na identidade. Eu quero uma estrada longa, cheia de novos horizontes, eventuais solavancos, riso, choro, gozo. Não me assustava fazer 50 anos, embora haja ainda um olhar de quase pena na fuça de quem acha que eu “tô ótima, apesar dos 50”. Estou ótima por cada um dos meus 50 anos e de como eles foram vividos. Não tenho medo de ficar velha, tenho medo é de ter uma vida besta.