Meirelles é fervido por Temer, pelo Congresso e pela própria parolagem

Elio Gaspari – Folha de São Paulo

Não se diga que estão fritando Henrique Meirelles. Ele é um queridinho do mercado, entende-se bem com Michel Temer e vocaliza as ortodoxias de gênios que sabem como consertar o Brasil, mas não conseguem conviver bem com seu povo. Meirelles está sendo fervido.

A fervura de um ministro difere da fritura porque enquanto a frigideira é desconfortável desde o primeiro momento, inicialmente o panelão oferece um calorzinho agradável. Depois é que são elas.

Desde o amanhecer do governo, Michel Temer flertava com a abertura de um balcão no Planalto. O ministro da Fazenda conseguiu contê-lo, até que surgiu o grampo de Joesley Batista. Para salvar seu mandato, o presidente abriu os cofres para os piores interesses predatórios instalados no Congresso. Não se deve esquecer que Meirelles foi levado para a Fazenda numa equipe em que estavam o senador Romero Jucá e o deputado Geddel Vieira Lima.

Temer deu a Meirelles quase toda a autonomia que ele pediu, mas o ministro não entregou os empregos e a perspectiva de crescimento que prometeu. Entrou no governo oferecendo um aumento de 1,6% para este ano e elevou o balão para 2%. Tudo fantasia, hoje o FMI espera 0,3%.

Na segunda-feira, ao ser indagado sobre a possibilidade de um novo aumento de impostos, ele informou: “Tudo é possível, se necessário”. Frase típica das serpentes encantadas pelos refletores. Não quer dizer absolutamente nada. Enuncia um dilema que exige a definição de “possível” e de “necessário”. Atravessar uma rua com o sinal fechado, por exemplo, pode parecer necessário, mas deixa de ser possível se o cidadão é atropelado. O Visconde de Barbacena achava que a derrama era necessária. Descobriu que não era possível.

Todos os ministros da Fazenda desempenham o papel da animadores do auditório. Alguns fazem isso com elegância, como Pedro Malan, outros, de forma patética, como Guido Mantega. Meirelles distanciou-se de Malan e caminha para o modelo de Mantega, num governo onde estão Michel Temer e seu mundo de bichos fantásticos.

Em fevereiro Meirelles anunciou pela primeira vez: “A mensagem importante é que essa recessão já terminou”. Atrás dele veio uma charanga comemorativa. No mundo real, seu teto de gastos estourou, a reforma da Previdência será diluída e benza-se aos céus se o piso dos 65 anos for preservado. No caso da reforma trabalhista fingiu-se que acabou o imposto sindical, ao mesmo tempo em que o governo negocia uma nova tunga. Antes, os trabalhadores formais pagavam um dia de trabalho a uma máquina infiltrada pela pelegagem e trabalhadores e patrões. Pelo que se negocia, algumas categorias serão mordidas em mais que um dia.

O remédio de Meirelles foi aumentar um imposto. Faça-se justiça ao doutor registrando que ele nunca se comprometeu a não aumentá-los. O seu problema é outro, Ele lida com essas taxações como se fossem uma arma para punir uma sociedade que é obrigada a pagar porque ele e seu presidente não fazem o serviço que prometem.

Um dia Meirelles deve dar uma olhada na galeria de doutores que o antecederam. Nos últimos vinte anos foram catorze. Pelo menos sete foram fritos. Antonio Palocci está na cadeia, uns três deveriam ter ido para o hospício. Inteiros, saíram só dois, Malan e Fernando Henrique Cardoso, mas todos foram homenageados pela mesma orquestra que hoje ensaboa Meirelles. 

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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