Meu amigo extraterrestre

Se o leitor acha o colunista estranho e meio desatinado por acreditar em discos voadores, UFOs ou OVNIs (na verdade, eu não acredito; sei que eles existem), hoje vai confirmar o seu julgamento. Acho que até já o fiz, em algum tempo no passado, mas hoje vou confessar ao Grupo dos Quinze (universo de leitores destes escritos) que, eu tenho um amigo extraterrestre. Além de mim, apenas meu bisneto, na flor dos dois anos e meio, o conhece. De vez em quando, nós três nos reunimos para agradáveis conversas, embora eu e o meu Bernardo nunca tenhamos visto pessoalmente o nosso amigo alienígena. Apenas sabemos que ele existe e está de olho em nós.

Nosso amigo está preocupado com a nossa Terra. Não entende a violência aqui existente, as diferenças sociais, a ganância, o desamor, a luta incessante pelo poder. Acha-nos muito primitivos. Perigosamente primitivos, melhor dizendo. Capazes – como diz – de ainda nos matarmos pelo poder. Político, territorial e religioso, como se isso fosse a coisa mais importante desta vida.

Surpreende-lhe, igualmente, o fato de que aqui a população ainda morra de fome, de sede e de frio, às vezes ao desamparo absoluto, apesar da fartura existente no planeta e de todo o avanço tecnológico desenvolvido pelos terrestres. Observa que recebemos a dádiva de um paraíso repleto de beleza e recursos naturais e o estamos devastando estupidamente.

Eu ainda tento justificar, alegando a nossa ignorância. Ele concorda, mas observa que já passou da hora de termos aprendido. E acrescenta que, ao contrário disso, continuamos julgando-nos o centro do universo. Ou achando que todo o cosmo foi criado apenas para nós. Uma pretensão idiota e intolerável – afirma.

— Vocês não entendem que ao agredir a natureza estão agredindo a si próprios e pondo em risco toda a vida aqui existente, pois vocês fazem parte da natureza e não existirão sem ela – adverte, para arrematar: “E ainda se dizem seres inteligentes…”.

Um dia desses, arrisquei fazer-lhe a clássica pergunta: Mas por que, ao invés de contatar-se com pessoas comuns, vocês não procuram os líderes e os governantes deste planeta, ou os cientistas que têm o conhecimento?

A resposta foi um autêntico cala-boca:

— Quem ?! Governantes, homens da ciência?! Ah, sim! Aqueles que conduziram vocês ao ponto em que hoje se encontram… Não é fácil entender porque?

Embora acabrunhado, ainda tentei:

— Mas deve haver alguém, nesse imenso planeta, que…

Interrompeu-me:

— Não há, sem exceção, entre aqueles que detém o poder. A vaidade, a arrogância, a presunção e a ambição contaminam muito rapidamente a todos. Experiências do passado foram catastróficas.

Lembrei-me, então, de Roswell e da Área 51, e calei-me. Ou, por outra, quase desolado, balbuciei uma derradeira indagação:

— Então, estamos perdidos?

— Nem tanto – consolou-me ele. Este território que vocês chamam de Brasil é um local fascinante e está fadado a ter um papel dos mais importantes no amanhã que se aproxima. Aqui, gente das mais diversas procedências, tendências, etnias, matizes e credos religiosos foi reunida e consegue viver em harmonia.

Fez uma pequena pausa e completou: “Apesar dos governantes”.

Em seguida, antes de se despedir, apontou (ou coisa que o valha) para o meu bisneto e fez uma estranha sugestão:

— Prestem atenção nas crianças!…

Só mais tarde fiquei sabendo porquê. Mas isso já é outra conversa, que talvez eu também lhe transmita algum dia, resignado leitor.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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