Nome central para a cultura dos anos 1960, cuja obra transcendeu as décadas em discos, filmes e peças de roupa, Jane Birkin, a inglesa mais francesa de todos os tempos, a beldade atemporal da canção, morreu neste domingo (16), aos 76 anos, em seu apartamento em Paris, na França. A causa da morte ainda não é conhecida.
Com seu estilo despojado e a beleza nada discreta, Birkin roubou os olhares do mundo da cultura nos anos 1960. No cinema, começou atuando em papéis secundários de obras como “Blow Up: Depois Daquele Beijo”, do diretor italiano Michelangelo Antonioni, e “Caleidoscópio”, de Jack Smight, os dois filmes de 1966.
Sua vida mudaria ao conhecer o cantor e compositor Serge Gainsbourg, um dos pensadores da canção francesa. Foi em 1969: os dois atuaram juntos em “Slogan”, um filme de amor dirigido por Pierre Grimblat. Logo, a história de amor, que duraria 13 anos, se tornou conhecida no mundo inteiro.
O casal gravou, naquele ano, o disco “Jane Birkin/Serge Gainsbourg”, que incluía a polêmica faixa “Je T’aime Moi Non Plus”. A canção simulava uma relação sexual, com gemidos e sussurros. Para o deleite de Gainsbourg, um provocador nato, o disco causou um escândalo internacional, sendo censurada em vários países, inclusive no Brasil, que já vivia o regime militar.
São várias as fotos e os vídeos que mostram o cotidiano do casal. Não por acaso, a intimidade de Birkin e Gainsbourg ainda é alvo do interesse das pessoas, nos tempos de Instagram. Do relacionamento, nasceu, em 1971, a atriz Charlotte Gainsbourg.
O cantor, relataria mais tarde a própria Birkin, se tornou uma pessoa temperamental. Consumido pelo álcool e pelo cigarro, Gainsbourg não tratava bem sua companheira. Misturando a vida pessoal com o personagem polêmico e maltrapilho, o cantor não pouparia nem a filha de seus escândalos.
Em 1986, a participação de Charlotte, então com 13 anos, no clipe de “Lemon Incest” causou polêmica, por supostamente incentivar relações incestuosas —e mesmo a pedofilia.
Seis anos antes, Birkin já havia se afastado de Gainsbourg. Apesar das polêmicas, mãe e filha louvaram até o fim a vida do artista. Recentemente, ainda diziam que ele seria censurado, em tempos “tão comportados”.
Birkin nasceu em 14 de dezembro de 1946, em Londres. Filha da atriz Judy Campbell e do militar da Marinha britânica David Birkin, ela cresceu em Chelsea e na cena cultural da Swinging London. Foi casada com o compositor John Barry entre 1965 e 1968, com quem teve sua primeira filha, a fotógrafa Kate Barry, morta em 2013.
Ela deixa a filha Lou Doillon, nascida em 1982, fruto da relação com o diretor de cinema Jacques Doillon, e que seguiu os passos da mãe, se destacando no cinema e na música.
No cinema, atuou ao lado de Serge Gainsbourg em diversos filmes menos célebres, como “Nineteen Girls and a Sailor”, do cineasta bósnio Milutin Kosovac, e filmes de gênero como “Sete Mortes nos Olhos de um Gato”, de Antonio Margheriti. Protagonizaria ainda o sensual “Paixão Selvagem”, de 1976, dirigido pelo então marido.
A partir do final dos anos 1970, participaria de produções maiores, como “Morte Sobre o Nilo”, de 1978, “La Fille Prodigue”, ao lado de Michel Piccoli, e “Assassinato num Dia de Sol”, de 1982. A grande cineasta francesa Agnès Varda daria protagonismo à atriz em “Kung-Fu Master!”, no qual a personagem de Birkin se apaixona por um garoto de 14 anos, e “Jane B. por Agnès V.”, um retrato impressionista no qual a estrela revisita a sua carreira.
Com os grandes autores faria ainda “A Bela Intrigante”, de 1991, de Jacques Rivette, novamente contracenando com Piccoli, e se lançaria na direção de filme em 2007 com o drama reflexivo “Caixas”, que também protagoniza, como uma senhora de meia-idade que tenta lidar com suas memórias.
No auge de sua popularidade, Birkin delimitou um estilo próprio de comportamento, se tornando um nome importante da moda. Inspirada em Birkin, a grife Hermès criou um modelo de bolsa com o seu nome, que ainda é disputada no mercado internacional.
Seguindo sua carreira musical, gravou, ao todo, 14 discos de estúdio, entre eles “Di Doo Dah”, de 1973, “Lost Song”, de 1987 e “Fictions”, de 2006. Dois anos antes, entoou “Leãozinho”, de Caetano Veloso, ao lado do artista baiano, no disco “Rendez-vous”.
Apesar da longa trajetória, Birkin se voltava, invariavelmente, ao repertório de Gainsbourg. Assim nasceu “Birkin/Gainsbourg: Le Symphonique”, um disco de 2017, com os sucessos que marcaram a vida do casal em um arranjo sinfônico. Dona de uma voz pequena e uma maneira sensual de cantar, Birkin se inscreveu na constelação de mulheres que, na canção francesa, falaram baixo e fizeram arte. O procedimento se aplica a Françoise Hardy até Carla Bruni.