Os recentes tiroteios no Texas e em Ohio reacenderam o debate sobre a letalidade das armas de fogo nos Estados Unidos. Tempestivamente, o Pew Research Center coligiu os dados mais atuais sobre mortes provocadas por armas no país.
Em 2017, 39.733 mortes foram causadas por armas – sendo 60% delas suicídios e 37% assassinatos. Considerando o total de assassinatos no país, três quartos foram por armas. De todos os suicídios, metade foi por armas. Em três anos os assassinatos por armas cresceram 32% e em uma década os suicídios cresceram 41%. Em bases per capita, a taxa de mortes por armas em 2017 foi de 12 pessoas por 100 mil – a maior em mais de duas décadas, mas menor que a do pico histórico de 1974, que foi de 16,3 por 100 mil. A taxa atual, de 4,6 assassinatos por 100 mil pessoas, está bem abaixo dos 7,2 registrados em 1974, assim como os atuais 6,9 suicídios por 100 mil estão abaixo dos 7,7 de 1977.
Os EUA estão na 20.ª posição mundial em taxas relativas de letalidade por armas. O ano de 2016 registrou 10,6 mortes a cada 100 mil pessoas, muito acima de países em condições socioeconômicas similares, como França (2,7), Canadá (2,1), Alemanha (0,9) ou Espanha (0,6), mas muito abaixo de vizinhos latino-americanos, como El Salvador (39,2), Colômbia (25,9) ou Brasil (19,4).
Um fenômeno peculiarmente norte-americano são os tiroteios em massa. Há grande variação nas estimativas, dada a dificuldade de definir consensualmente o termo “tiroteio em massa”. O FBI utiliza a indexação “incidentes com atiradores ativos” ou seja “um ou mais indivíduos ativamente empenhados em matar ou tentar matar pessoas em uma área populosa”. Segundo essa definição, 85 vítimas morreram em 2018. Já o Arquivo de Violência por Armas define tiroteios em massa como incidentes nos quais pelo menos quatro pessoas são baleadas. Nestes termos, 373 vítimas morreram em 2018. Apesar de as variações anuais no número de tiroteios em massa tornarem difícil identificar uma tendência inequívoca, o FBI registra um crescimento alarmante. Entre 2000 e 2006, a média de incidentes foi de 6,4 por ano; entre 2007 e 2013, foi de 16,4; entre 2014 e 2016, de 20; e em 2017 houve 30 incidentes.
Outra pesquisa recente do Pew Research permite vislumbrar a cultura e os hábitos sociais por trás desses fatos. Três em cada dez americanos possuem uma arma. Dois terços (67%) desses proprietários declaram que sua principal razão é a autodefesa – além disso, predominam a caça (38%) e o tiro esportivo (30%). Quase seis em cada dez americanos (57%) entendem que a legislação deveria ser mais restritiva, enquanto 31% estão satisfeitos e 11% acreditam que deveria ser menos restritiva.
Apesar das dissidências históricas entre republicanos e democratas, há algumas políticas sobre as quais há concordância. Nove em dez republicanos e democratas acreditam que pessoas com transtornos mentais, assim como aquelas registradas em listas de vigilância, não deveriam poder comprar armas, e a maioria dos democratas (91%) e republicanos (79%) é a favor da checagem de antecedentes para as vendas privadas de armas. Por outro lado, republicanos são muito mais favoráveis do que os democratas a que funcionários de escolas possam portar armas e que cidadãos possam portar armas em locais hoje proibidos (68% contra 22%). Os democratas são muito mais favoráveis ao banimento de rifles de assalto (81% contra 50%).
Em relação aos efeitos das restrições legais, os americanos estão divididos: 47% acreditam que elas reduziriam os tiroteios, enquanto 46% dizem que não mudariam nada. Já quanto aos crimes, 37% acham que aumentariam se mais americanos possuíssem armas; 33% dizem que não haveria diferença; e 29% acreditam que haveria menos crimes.
Em um momento em que o Brasil discute seus regulamentos sobre armas, pesquisas como essas são oportunas para lembrar que o debate, além de ser conduzido com espírito cívico, deve ser abastecido por dados sólidos.